Nesta semana lemos a Parashá Kedoshim (literalmente "Sagrados"), que contém aproximadamente 70 Mitzvót, sendo a maioria delas Mitzvót "Bein Adam Lehaveiró" (entre a pessoa e seu companheiro). Algumas destas Mitzvót são muito conhecidas, como a obrigação de deixar partes do nosso campo para que os pobres possam vir recolher seu alimento, além da proibição de odiarmos o próximo, de guardar rancor e de se vingar. No começo da Parashá está escrito "Fale a toda a congregação dos filhos de Israel" (Vayikrá 19:2). O Midrash nos ensina que esta Parashá é diferente das outras Parashiót, pois nas outras Parashiót a transmissão foi feita apenas aos homens, mas as Mitzvót desta Parashá foram transmitidas para "toda a congregação", que incluía também as mulheres e as crianças. Isso ocorreu principalmente por dois motivos. Em primeiro lugar, as Mitzvót que aparecem nesta Parashá são fundamentais para a construção de uma sociedade harmônica, em especial a Mitzvá de "Ame ao próximo como a si mesmo", que um dos maiores sábios da história do povo judeu, Rabi Akiva, definiu como sendo "um grande fundamento da Torá". Certamente o mundo seria bem diferente se conseguíssemos cumprir com perfeição esta Mitzvá. Seria um mundo mais justo, mais harmônico e muito mais feliz. Além disso, as muitas Mitzvót contidas nesta Parashá trazem paralelos com os 10 Mandamentos. Da mesma forma que os 10 Mandamentos foram entregues diante de toda a congregação, D'us ordenou a Moshé que também a Parashá Kedoshim fosse transmitida para toda a congregação. Dentre todas as Mitzvót da nossa Parashá, há uma que tem uma importância especial: "Repreenda seu companheiro, e que a transgressão não recaia sobre você" (Vayikrá 19:17). A Mitzvá consiste em chamar a atenção de alguém que foi visto cometendo um erro. A priori esta é uma Mitzvá "Bein Adam LaMakom" (entre o homem e D'us). É como se tivéssemos recebido a missão de sermos "policiais" de D'us, protegendo Seus mandamentos e corrigindo as pessoas que estão se desviando do seu cumprimento. A Mitzvá, desta ótica, seria um comando para sermos supervisores uns dos outros, para que as leis da Torá sejam cumpridas e, quando necessário, devemos chamar a atenção daqueles que se desviam. Porém, se esta é realmente a intenção da Torá no cumprimento da Mitzvá de repreender, surgem alguns questionamentos. Em primeiro lugar, percebemos que há uma continuação no versículo da Mitzvá de repreender nosso companheiro: "E que a transgressão não recaia sobre você". O que significam estas palavras? O entendimento mais simples é que a Torá não permite a "omissão de socorro". Da mesma maneira que é crime não fazer nada para salvar alguém que está se afogando, se estiver ao seu alcance ajudar a pessoa, também é proibido, e grave, permitir que alguém se "afogue" espiritualmente em transgressões, que afastam a pessoa de D'us e podem fazê-la perder a eternidade. Se vemos alguém errando, é nossa obrigação chamar sua atenção. Entretanto, também podemos entender estas palavras de outra maneira. Ao repreender alguém, não podemos repreender de qualquer forma. Devemos ter muito tato e sensibilidade para não humilhar o outro, mesmo que ele esteja cometendo alguma transgressão grave. Caso a repreensão seja feita de forma descuidada, como alguém que repreende seu companheiro a ponto de deixá-lo envergonhado em público, no final das contas a transgressão recai sobre aquele que repreendeu mal. Porém, por que isso seria proibido? Mesmo que há uma Mitzvá negativa de não envergonhar as pessoas, a Mitzvá positiva de repreender o próximo deveria prevalecer. Se o preceito é "Bein Adam LaMakom", para proteger as Mitzvót de D'us, então isso deveria ser permitido repreender, mesmo às custas da vergonha do indivíduo transgressor! Além disso, até que ponto alguém deve repreender seu companheiro? De acordo com o Talmud (Arachin 16b), a repreensão deve ser feita repetidas vezes, mas somente até o ponto em que aquele que está sendo repreendido queira agredir fisicamente ou amaldiçoar aquele que repreende. Porém, este "limite" do Talmud é difícil de ser entendido, pois em outras Mitzvót da Torá não existem limites como estes. Se uma pessoa precisa colocar Tefilin em público e alguém a está amaldiçoando ou a ameaçando, a pessoa não está isenta de cumprir a Mitzvá. Então por que a Mitzvá de repreender é diferente? A resposta é que, na realidade, a Mitzvá de repreender o próximo não é uma Mitzvá "Bein Adam LaMakom", e sim uma Mitzvá "Bein Adam Lechaveiró" (entre o homem e seu companheiro), da mesma forma que as outras Mitzvót que aparecem nos versículos adjacentes, como não odiar seu companheiro, não se vingar e não guardar rancor, também são "Bein Adam Lechaveiró". Portanto, o fundamento da Mitzvá de repreender é fazer com que aquele que está sendo repreendido sinta que aquele que o repreende está lhe fazendo um favor. O transgressor deve sentir como se aquele que o repreende estivesse devolvendo a ele um objeto perdido. O Rav Yaacov Kamenetzky zt"l (Lituânia, 1891 - EUA, 1986) ilustra de forma interessante como devemos enxergar a Mitzvá de repreender. Reuven foi pedir dinheiro emprestado ao seu amigo Shimon. Quando ele entra na casa de Shimon, vê lá dentro um estelionatário, que enganava muitos milionários, pedindo grandes empréstimos para fazer investimentos que não existiam. Shimon, um homem de coração extremamente bondoso, não desconfiava que aquele homem em sua casa era um trapaceiro. Não é óbvio que Reuven precisa imediatamente revelar a Shimon que ele não deve emprestar dinheiro a este homem? Reuven pode ficar tranquilo de saber que seu amigo Shimon ficará muito feliz com sua intervenção, pois se não fosse isso, ele acabaria sendo salvo de uma enorme perda financeira. É como esta mesma intenção que a pessoa deve cumprir a Mitzvá de repreender seu companheiro, para salvá-lo de uma enorme perda espiritual. Repreender é um ato de amor, uma demonstração de preocupação verdadeira e sincera com o próximo. A própria palavra "Leochiach", que significa "repreender", vem da linguagem "Ochachá", que significa "demonstrar". Repreender significa mostrar o caminho certo para quem errou. Portanto, se aquele que repreende envergonha o transgressor, transmite a impressão de que o odeia. Certamente esta repreensão não ajudará nada em corrigir o erro e, portanto, destruirá o propósito da Mitzvá de repreender. Assim, não se aplicaria dizer que a Mitzvá positiva de repreender prevalece sobre a Mitzvá negativa de não envergonhar, já que a Mitzvá positiva não foi cumprida. Ame ao próximo como a si mesmo. Críticas são para ajudar. Da mesma forma que gostaríamos de ser ajudados, então ajude o próximo. Mas ajude com amor, com sensibilidade. Esta é a base de uma sociedade harmônica. SHABAT SHALOM R' Efraim Birbojm |
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