Nesta semana lemos a Parashá "Chaie Sara" (Literalmente "A vida de Sara"), que conta sobre o falecimento de Sara, nossa primeira matriarca. Ela era uma mulher tão virtuosa que, pelos seus incríveis méritos, três grandes milagres aconteciam: uma nuvem ficava parada sobre a sua tenda, as velas de Shabat duravam a semana inteira e a massa da sua Chalá permanecia sempre fresca. Porém, quando ela faleceu, os três milagres deixaram de acontecer. O filho de Sara, Ytzchak, ficou inconsolável por três anos com a terrível perda, e somente se consolou quando encontrou uma esposa, Rivka, que trouxe de volta os três milagres, demonstrando que também era uma mulher extremamente virtuosa. Rivka acabou se tornando a segunda matriarca do povo judeu. Porém, de onde surgiu Rivka? Logo após o episódio da Akeidat Ytzchak, D'us profetizou para Avraham o nascimento de Rivka, neta de seu irmão Nachor. Esta profecia era justamente para indicar a Avraham que ele não precisaria casar seu filho com uma mulher de Knaan, pois elas eram amaldiçoadas. Mas ainda havia um problema técnico: como Ytzchak havia sido elevado em um altar, como um Korban, ele adquiriu tamanha santidade que não podia mais sair de Eretz Israel. Como ele procuraria uma esposa? Avraham então enviou seu fiel servo Eliezer para procurar uma esposa para Ytzchak em sua terra natal, entre os seus familiares. Eliezer, acompanhado de alguns ajudantes e muitos camelos, partiu para a terra dos parentes de Avraham em sua importante missão de encontrar uma esposa para Ytzchak. O que esperaríamos dele? Que ele chegaria na cidade e procuraria indicações de boas moças. Depois de fazer uma pré-seleção, ele entrevistaria as moças consideradas mais adequadas e, entre elas, decidiria qual poderia se casar com Ytzchak. Além disso, ele deveria ter começado procurando pela família de Avraham, conforme ele havia pedido. Porém, não foi nada disso que Eliezer fez. Ele chegou na cidade e ficou parado ao lado de um poço de água. Ele então fez um aparente "jogo de adivinhação", escolhendo um sinal que, caso fosse observado em alguma moça que passasse por ali, indicaria que ela era a escolhida. Acabou dando certo, mas essa é a forma correta de escolher uma esposa? Explica o Talmud (Chulin 95b) que, na realidade, o que Eliezer fez não foi considerado uma forma de adivinhação, pois no sinal que ele pediu para encontrar uma esposa para Ytzchak havia algo concreto. Ele não se apoiou em magia ou em sinais aleatórios, tais como "a mulher que estiver usando um vestido florido". Ele estava procurando, através do sinal escolhido com muita sabedoria, uma mulher com características que ele considerava fundamentais para que fosse uma boa esposa. Tendo vivido tantos anos na casa de Avraham, Eliezer valorizava muito os atos de Chessed. Então ele fez a seguinte condição: se a moça para quem ele pedisse um pouco de água também oferecesse água aos seus camelos, esta seria a esposa escolhida. Porém, isto desperta um grande questionamento. É verdade que uma esposa que faz Chessed é muito importante para construir um casamento verdadeiro e sólido. Porém, somente isso era necessário verificar? A esposa não precisava ter outras caraterísticas, como pureza de coração, Emuná, temor a D'us e outros bons traços de caráter? Por que Eliezer não checou esses pontos também? De acordo com o Rav Meir Rubman zt"l (Lituânia - Israel, 1967), a resposta deste questionamento está em um ensinamento dos nossos sábios: "Rabi Yochanan ben Zakai disse para seus alunos: 'Saiam e vejam qual é o caminho reto que a pessoa deve se conectar'. Rabi Eliezer disse: um bom olho; Rabi Yehoshua disse: um bom amigo; Rabi Yossi disse: um bom vizinho; Rabi Shimon disse: prever os acontecimentos futuros. Rabi Elazar disse: um bom coração. Rabi Yochanan ben Zakai disse a eles: 'Eu prefiro as palavras de Elazar ben Arach, pois nas palavras dele as palavras de vocês estão incluídas'" (Pirkei Avót 2:9). Mas o que significa que todas as boas qualidades mencionadas pelos outros alunos estavam contidas na característica de ter um bom coração? Explica o Rav Ovadia MiBarternura zt"l (Itália, 1445 - Israel, 1515) que o coração é o gerador de todas as outras forças e é a fonte da qual emanam todas as ações. Mesmo que haja membros específicos para cada tipo de ação, o lugar da força que estimula todas as ações está no coração. Portanto, ao observar se Rivka tinha um bom coração, automaticamente as outras características também estavam sendo checadas. Mas de que maneira o bom coração inclui todas as outras características descritas pelos alunos do Rabi Yochanan ben Zakai? De acordo com o Rav Yehuda Loew zt"l (Polônia, 1525 - República Checa, 1609), mais conhecido como Maharal de Praga, quando o coração de uma pessoa está tranquilo e feliz, então ela olha de forma positiva para todas as pessoas e situações. Desta maneira ela terá sempre bons amigos e se dará bem com seus vizinhos. Além disso, ela terá tranquilidade suficiente para refletir e prever com sabedoria os acontecimentos futuros. Mas como verificamos se a pessoas tem um bom coração? Somente verificando se a pessoa fez um bom ato não é suficiente para saber se ela tem um bom coração, pois muitas vezes a pessoa só faz uma bondade porque os outros estão olhando, isto é, ela faz pela sua honra, não pelo bem do próximo. Outras vezes a pessoa ajuda um pobre pois a pobreza do outro incomoda, isto é, o bom ato é pelo seu próprio bem estar, não pela bondade verdadeira. Então como saber se o ato de bondade veio realmente de um coração bondoso? Eliezer demonstrou sua enorme sabedoria quando definiu o sinal para identificar a esposa adequada para Ytzchak. Um camelo bebe dezenas de vezes mais água do que um ser humano, justamente por sua capacidade de armazenar muita água e vencer enormes travessias no deserto. Dar de beber a um camelo envolvia um enorme esforço, já que a água precisava ser retirada manualmente de um poço, e muitas vezes a pessoa precisava subir e descer escadarias para conseguir tirar a água. E se dar de beber a um camelo já era algo trabalhoso, imagine o trabalho envolvido em dar de beber a dez camelos! Além disso, Eliezer e os homens que estavam com ele eram pessoa saudáveis e estavam ao lado do poço. Facilmente poderiam ter pegado pessoalmente a água, e não havia nenhum motivo para sentir misericórdia deles, como sentiríamos se fossem pessoas fisicamente incapacitadas, como idosos ou deficientes. E, apesar de serem pessoas saudáveis e fortes, tiveram o descaramento de pedir para uma pequena garotinha algo que envolvia um tremendo esforço físico. Enquanto Rivka subia e descia dezenas de vezes com o pote cheio de água, Eliezer ficou assistindo e não mexeu nem mesmo um dedo para ajudá-la. Como nós reagiríamos a esta situação? Certamente pensaríamos: "Mas que homem folgado! Não vou ajudar este homem acomodado! Ele tem força suficiente para pegar água sozinho, está apenas querendo se aproveitar da minha boa vontade!". Mas não foi assim que Rivka reagiu. Imediatamente ela começou a ser esforçar para servir água a Eliezer e aos seus camelos. E Eliezer percebeu que ela fazia isso com um sorriso no rosto. Era certamente um sinal de que ela tinha um bom coração. Também vemos outros detalhes que fazem a bondade de Rivka ser ainda mais especial e única. Ele fez tudo correndo, com agilidade, para deixá-los esperando o mínimo tempo possível. Isso tudo enquanto aquele grupo de homens saudáveis apenas assistia, sem ajudar nada. E ela fazia com alegria, como se estivesse servindo a um grupo de pessoas debilitadas. Esse era definitivamente um sinal de um bom coração, pois aquele que tem um bom coração tem vontade de ajudar o próximo e se alegra com cada oportunidade de fazer o bem. Isso demonstrava que os motivos de Rivka fazer bondade eram realmente puros, sem nenhuma outra intenção. O Sefer Bereshit é repleto de histórias. São os acontecimentos da vida dos nossos patriarcas e matriarcas que D'us quis registrar justamente para nos ensinar e inspirar. Que possamos aprender de Rivka a buscar a pureza e a alegria nos atos de bondade, nos esforçando para atingir a qualidade mais importante: um bom coração. SHABAT SHALOM R' Efraim Birbojm |