Nesta semana lemos a Parashá Vaieshev (literalmente "E se assentou"), que começa a descrever a história de Yossef e seus irmãos. Motivados pela inveja, os irmãos de Yossef acabaram vendendo-o como escravo ao Egito. A Torá registra um detalhe aparentemente insignificante: Yossef foi transportado em uma caravana de especiarias. Qual é a importância de ressaltar qual era o produto transportado na caravana que levou Yossef? Explicam os nossos sábios que, apesar da difícil situação na qual Yossef se encontrava, quando seus próprios irmãos haviam tramado matá-lo e acabaram vendendo-o como escravo, ainda assim ele conseguiu perceber a Mão de D'us em todos os eventos. Rashi (França, 1040 -1105) explica que o normal era passarem naquela região caravanas transportando derivados de petróleo, que normalmente têm um cheiro muito desagradável. Yossef percebeu a Mão de D'us ao fazê-lo viajar com um cheiro agradável. Mesmo que a situação estava difícil, Yossef se manteve tranquilo e confiante na proteção de D'us, pois sabia que nada acontece por acaso. Este conceito se conecta com a próxima Festa do calendário judaico, Chanuka, que comemoramos a partir da noite do próximo domingo (28 de novembro). São oito dias nos quais revivemos dois incríveis milagres que aconteceram com o povo judeu na época do Segundo Templo. Um milagre foi a vitória na guerra contra o maior império da época, os gregos, militarmente muito superiores. O segundo milagre foi o azeite para o acendimento da Menorá, suficiente para apenas um dia, mas que durou oito dias. Milagres que nos conectam com D'us e que nos fazem sentir Sua presença nos acontecimentos cotidianos. Durante os oito dias de Chanuka temos algumas Mitzvót que nos ajudam a nos conectar com a espiritualidade destes dias. Por exemplo, acendemos diariamente a Chanukia e ficamos por alguns momentos apenas olhando para as velas, refletindo sobre a vida. Além disso, recitamos todas as manhãs o Halel, um cântico de louvor e agradecimento a D'us. Mas o Halel de Chanuka não é simplesmente parte do serviço da Tefilá, como acontece nos outros Chaguim, e sim a própria essência deste Chag. Este é a linguagem do Talmud (Shabat 21b) que fala sobre Chanuka: "Fixaram e fizeram daqueles dias Yamim Tovim, dias de Halel (louvores) e Hodaá (agradecimento)". Essa também é a linguagem no final do "Al Hanissim", parte da Amidá acrescentada nos oito dias de Chánuka: "Para Lehodot (agradecer) UleHalel (e louvar)". Normalmente dizemos Halel para agradecer por algum milagre que aconteceu, mas em Chanuka dizemos Halel porque o milagre em si tem a ver com o Halel. Qual é a explicação deste conceito? Sempre enxergamos Chanuka como a batalha entre os judeus e os gregos. Porém, na verdade a batalha não foi apenas entre os gregos e os judeus, mas também entre os Tsedukim e os judeus. Quem eram os Tsedukim e que batalha foi esta? Para responder, precisamos lembrar de algo muito importante em relação à nossa Torá. Ela foi entregue para Moshé no Monte Sinai, sendo que uma parte foi entregue de forma escrita, que são os cinco livros da Torá, enquanto outra parte foi entregue apenas oralmente, e continuou sendo transmitida oralmente, de professor para aluno, de geração em geração. A Torá escrita traz os principais ensinamentos de D'us, mas de uma maneira muito compacta, quase codificada. Já a Torá oral traz todos os detalhes de todas as Mitzvót e suas explicações mais profundas. Um paralelo interessante seria uma palestra que escutamos e queremos guardá-la para sempre. Não é possível anotar tudo o que o palestrante diz, então fazemos algumas anotações resumidas, mas que sejam suficientemente claras para, ao serem lidas, nos façam lembrar de todos os detalhes do que foi falado. A palestra seria a Torá oral, enquanto as anotações seriam a Torá escrita. Os Tsedukim eram uma seita que rejeitava a Torá oral. Eles queriam cumprir a Torá exatamente como entendiam ao pé da letra, cometendo, desta maneira, muitos erros. Por exemplo, os Tsedukim não comiam comidas quentes no Shabat, por acreditarem, de forma equivocada, que era proibido até mesmo esquentar comidas que já estavam completamente cozidas. Eles também passavam praticamente o Shabat todo na cama, dormindo, por não saberem os detalhes do que é permitido e o que é proibido fazer no Shabat. E, além de acabar desrespeitando a Torá por entendê-la de forma equivocada, o mais grave foi que os Tsedukim também instigaram os gregos contra o povo judeu, delatando-os para as autoridades em troca de poder e dinheiro. Mas por que era tão difícil para os Tsedukim aceitarem a Torá oral? E por que os gregos "compraram a briga" dos Tsedukim contra o povo judeu? Explica o Rav Yaacov Weinberg zt"l que os gregos eram um povo que gostava de cultura e de conhecimento. Através de sua cultura Helenista, eles levaram diversos avanços para todos os lugares que conquistavam, como a ciência, a literatura, o teatro e os esportes. Porém, eles não queriam se submeter a uma Força superior. Eles podiam aceitar a Torá escrita, pois somente com a Torá escrita eles poderiam interpretar os conhecimentos contidos nela da maneira que quisessem. Na Torá escrita não é necessário "entregar a mente" a D'us, isto é, submeter o nosso conhecimento ao conhecimento infinito de D'us. Com a Torá escrita ainda podemos ter a sensação de que nossa mente é suprema e que é a lógica do ser humano que importa. Desta maneira é possível escolher entender e cumprir a Torá da forma como quisermos, assim como faziam os Tsedukim. A Torá oral, no entanto, não foi aceita pelos gregos, pois significava que nosso intelecto deve se adequar à maneira como D'us nos ensinou a pensar. Até que a Torá nos diga o que é correto, a ciência e a lógica são apenas ilusões. Por exemplo, o que é mais grave, roubo ou furto? A mente humana tenderia a responder que certamente o roubo é mais grave, pois envolve violência, uma ameaça à integridade física da pessoa, enquanto o furto ocorre sem nenhum tipo de ameaça. Porém, a Torá nos ensina que aquele que rouba deve apenas devolver o que foi roubado, enquanto aquele que furta deve pagar uma "multa", que normalmente é o dobro do valor furtado, mas que pode chegar a 4 ou 5 vezes em determinadas situações. Qual é a lógica? Explica o Talmud (Baba Kama 79b) que a pessoa que rouba em plena luz do dia demonstra que não tem medo de ninguém, nem de D'us e nem das pessoas, mas a pessoa que furta na calada da noite demonstra que tem medo das pessoas, mas não tem medo de D'us, o que é ainda mais grave. Através da Torá oral, portanto, entendemos um pouco mais a "forma de pensar" de D'us. Isso significa que devemos submeter a nossa forma de pensar à forma de pensar Dele. Esta "batalha ideológica" tem uma forte implicação na forma como vemos a vida. Para um grego, um milagre é impossível. E se um milagre acontece, é apenas porque ainda não entendemos todos os fatos. Os gregos não aceitam o conceito de Halel, pois não há ninguém a quem agradecer. Tudo é natural, tudo pode ser explicado como sendo fenômenos físicos, químicos e biológicos. Portanto, na Torá escrita, a "Torá do mundo material", não há Halel. O Halel só existe na Torá oral. É através da Torá oral que declaramos que entregamos nossas mentes a D'us, a Força máxima que controla tudo. Desta maneira surge o reconhecimento e o agradecimento. Chanuka é a batalha entre o intelecto independente e o intelecto humilde, submetido a D'us. Expressamos nossa vitória de Chanuka através do Halel e do agradecimento, pois é isso que define Chanuka. Através dos louvores e do agradecimento podemos expressar nossa submissão a D'us, mostrando que Ele é a fonte de todo o entendimento, e não a nossa lógica e razão, que são totalmente limitadas. SHABAT SHALOM E CHANUKA SAMEACH R' Efraim Birbojm |