Nesta semana lemos a Parashá Vayigash (literalmente "E se aproximou"), que continua descrevendo a saga de Yossef e seus irmãos. Yossef havia testado seus irmãos, acusando Biniamin de roubo e condenando-o a ser escravo, para ver se eles estavam arrependidos de tê-lo vendido como escravo. Após Yehudá dizer que estava disposto a ficar como escravo no lugar de Biniamin, Yossef não aguentou e finalmente se revelou aos irmãos, deixando-os em estado de choque. Eles mal podiam acreditar que aquele jovem, que aos 17 anos havia sido vendido como escravo, agora havia se tornado o vice-rei do Egito, uma das pessoas mais poderosas do mundo. Depois da emocionante revelação, Yossef disse aos irmãos: "E agora, não fiquem tristes, não se aflijam por terem me vendido, pois foi para propiciar o sustento que D'us me enviou à frente de vocês" (Bereshit 45:5). Yossef tentou deixá-los à vontade, demonstrando que não guardava nenhum ressentimento e assegurando-lhes que tudo o que havia acontecido com ele era parte de um grande plano de D'us. Precisamos tentar trazer as histórias da Torá para o nosso cotidiano. Se nos colocássemos no lugar de Yossef, teríamos sido tão generosos? Yossef sofreu muito devido ao que seus irmãos lhe causaram. Quando relembramos sua história de vida, percebemos que Yossef foi muito maltratado. Ele foi condenado à morte pelos irmãos, atirado em um poço cheio de cobras e escorpiões e retirado para ser vendido como escravo. Depois disso, quando Yossef imaginou que seus sofrimentos haviam acabado, ele foi injustamente acusado de importunar a esposa de Potifar e foi atirado na prisão, sem direito de se defender, onde sofreu por longos 12 anos. Não era uma prisão com ar condicionado e televisão, era uma masmorra subterrânea, provavelmente com condições precárias. Em resumo, foram anos de muitos sofrimentos, físicos e psicológicos. Esperaríamos que Yossef, ao se revelar aos seus irmãos, exigiria um pedido de desculpas deles. Agora que ele era poderoso, poderia exigir que implorassem pelo seu perdão. No entanto, Yossef não fez nada disso. Ele teve uma abordagem misericordiosa, não se aproveitou do fato de "estar por cima". Tentou, além de tranquilizar os irmãos, consolá-los pelo erro que haviam cometido, dizendo: "Não fiquem chateados, tudo acabou se transformando em algo melhor. D'us me enviou aqui para fornecer comida para vocês". Como uma pessoa tem a força espiritual e psicológica para fazer isso? Afinal, Yossef era um ser humano, com sentimentos e fragilidades. Ele também estava submetido às emoções humanas de rancor e vontade de se vingar daqueles que fizeram tão mal a ele. Seria perfeitamente compreensível que um ser humano normal guardasse ressentimentos em tal situação. Porém, Yossef parece estar acima de tudo isso. Não apenas ele não guardou rancor, como também foi misericordioso e perdoou seus irmãos. Como ele conseguiu chegar neste nível? Explica o Rav Yssocher Frand que Yossef está nos ensinando um segredo sobre como devemos lidar com pessoas que nos prejudicam. Normalmente nos irritamos e guardamos um profundo rancor. Porém, se a pessoa tem uma Emuná completa, se ela entende de forma profunda o conceito da "Hashgacha Pratit", de que há uma Providência Divina, um controle completo e soberano de D'us sobre tudo o que acontece no mundo, mesmo nos menores detalhes, então não há nenhuma razão para estar irritado com alguém que possa ter feito mal a ela. Essas foram as palavras que Yossef falou aos seus irmãos. Ele disse que não guardava rancor, pois havia enxergado que este era obviamente o plano de D'us, o Todo Poderoso. Ele havia sido enviado com o propósito de sustentar sua família durante os anos de fome extrema. Se isso não tivesse acontecido, todos teriam morrido de fome. Yossef entendeu, de forma clara e plena, que somos todos marionetes, participando de um grande plano, do qual quem tem controle é apenas o Criador do Universo. É Ele quem está movimentando as "cordas" das marionetes. Se olharmos o mundo através desta perspectiva, um indivíduo que foi injustiçado pode dizer sinceramente àquele que o prejudicou: "Não tenho queixas contra você, porque tudo isso era parte da Hashgacha Pratit, tudo foi planejado, supervisionado e implementado por D'us". Ensina o Talmud (Shabat 105b) que qualquer um que fica furioso é como se tivesse feito idolatria. Mas o que isso significa? Entendemos que perder a cabeça é algo grave, que pode levar a consequências desastrosas, mas qual é a relação entre ficar com raiva e fazer idolatria? A resposta é que ficamos com raiva porque achamos que as coisas não estão indo da forma como gostaríamos. Se uma pessoa tivesse uma Emuná verdadeira, se colocasse no coração que tudo ocorre sob a Hashgacha Pratit do Criador, perceberia que quando as coisas não acontecem do jeito que gostaríamos, é porque o Todo Poderoso quer desta maneira. Somos limitados, nosso entendimento e nossa visão são limitados, enquanto D'us é infinito e ilimitado. Portanto, quando ficamos com raiva, estamos negando que D'us governa o mundo. Essa é exatamente a filosofia da idolatria, que é acreditar que existem outras forças além de D'us que controlam o que acontece no mundo. O Sefer Hachinuch expressa a mesma ideia. Na Mitzvá 241, que explica a proibição da Torá de se vingar, assim está escrito: "A razão para a Mitzvá é que uma pessoa deve saber e colocar no coração que tudo o que acontece com ela, seja bom ou ruim, vem de D'us. E mesmo que venha através da mão de um homem, nada acontece sem a vontade de D'us. Portanto, quando uma pessoa lhe causa dor ou angústia, você deve saber que suas próprias transgressões são a causa, e foi D'us que decretou que isso deveria acontecer. Você não deve pensar em se vingar da pessoa que lhe prejudicou, pois ela não é a causa verdadeira do seu infortúnio; a transgressão é a causa". O Sefer Hachinuch então cita um interessante acontecimento na vida de David Hamelech. Quando ele estava fugindo de Shaul Hamelech, David foi amaldiçoado por um homem chamado Shimi ben Gueira. Quando os homens que acompanhavam David quiseram matá-lo por suas maldições contra o rei, David disse: "Deixe-o amaldiçoar, porque D'us disse a ele para fazer isso" (Shmuel II 16:11). David atribuiu o sofrimento pelo qual estava passando aos seus próprios erros, e não a Shimi ben Geira. A analogia é que, se alguém nos acerta com um bastão, não ficamos bravos com o bastão. Percebemos que o bastão não é a causa da nossa dor, e sim aquele que o segura. D'us usa certas pessoas como "bastões" para fazer a Sua justiça. É óbvio que a pessoa que nos prejudicou é responsável por suas ações e será julgada por seus maus atos. D'us utiliza o livre arbítrio das pessoas para cumprir Sua vontade, mas cada um prestará contas por suas escolhas. O "bastão" também terá que enfrentar o Julgamento Divino por seus atos. A Emuná apenas nos ensina a não direcionarmos a raiva ao agressor, pois se alguém nos fez algum mal, foi com a permissão de D'us, para algum propósito bom, como nos trazer limpeza espiritual ou nos salvar de um perigo maior. David Hamelech, em sua grandeza, percebeu que seu problema não era com Shimi ben Geira, seu problema era consigo mesmo, era entre ele e D'us. Não é um nível fácil de autocontrole e de Emuná, mas se tivéssemos essa atitude na vida, sentiríamos muito menos ódio e rancor. Se levássemos essas palavras ao coração, isso nos ajudaria muito a corrigirmos nossos próprios erros, além transformar o mundo em um lugar mais harmônico. SHABAT SHALOM R' Efraim Birbojm |