sexta-feira, 16 de abril de 2010

SHABAT SHALOM MAIL - PARASHIOT TAZRIA E METZORÁ 5770

BS"D

COM O QUE VAMOS MORRER? – PARASHIOT TAZRIA E METZORÁ 5770 (16 de abril de 2010)

"Alexandre Shechter (nome fictício) era um jovem que, apesar de ser judeu, havia sido criado em uma casa não-religiosa e por isso tinha poucos conhecimentos sobre o judaísmo. Aos 20 anos, após alguns meses frequentando aulas sobre judaísmo, ele começou a se interessar um pouco mais e decidiu que era hora de ir para uma Yeshivá (Centro de estudos judaicos). Como ele estava no meio da faculdade, teria que trancar a matrícula. Conversou com os pais e combinou que estudaria por 6 meses em uma grande Yeshivá que ficava em outra cidade e depois retornaria para terminar seus estudos na faculdade. Os pais, apesar de receosos, concordaram.

Aquele tempo na Yeshivá foi fantástico. Alexandre dedicava boa parte do seu dia a conhecer as leis da Torá e a se aprofundar nos estudos do Talmud, coisas que nunca tivera oportunidade na vida. Ele sentia que se tornava, a cada dia, uma pessoa melhor. Quando os 6 meses terminaram, Alexandre achou que ainda não estava pronto para voltar para casa. Precisava de um pouco mais de tempo para estudar e conhecer o judaísmo que ele havia desconhecido sua vida inteira. Ligou para os pais, explicou como estava contente com seus estudos e os novos conhecimentos e pediu mais 6 meses de prorrogação. Os pais aceitaram.

Porém, passados mais 6 meses, Alexandre ainda não estava satisfeito. A Yeshivá tinha aberto seus olhos, ele via o mundo de outra maneira e queria continuar crescendo espiritualmente. Queria terminar a faculdade, mas somente depois de construir uma sólida base espiritual. Porém, desta vez, quando pediu ao pai mais 6 meses de estudo, o pai negou veementemente. Por mais que o rapaz insistisse, o pai estava decidido que era hora dele voltar. Chegou ao ponto de viajar para a Yeshivá pessoalmente para colocar as coisas do filho na mala e trazê-lo de volta para casa. Quando estavam saindo da Yeshivá, o pai quis agradecer pessoalmente ao Rosh Yeshivá (Diretor espiritual) por toda a atenção e o cuidado que seu filho havia recebido durante aquele ano. Conversaram bastante e o pai se mostrou muito contente com todas as mudanças positivas de atitude que havia percebido no filho. Quando estavam saindo, o Rosh Yeshivá perguntou:

- Desculpe-me, mas se o senhor acha que seu filho está tão bem, por que vai levá-lo de volta para casa? Por que não o deixa seguir seus estudos judaicos aqui na Yeshivá por mais algum tempo?

- Escute aqui, rabino – falou duramente o pai – nós estamos na América, um lugar difícil de viver. A concorrência no mercado de trabalho é terrível. Se meu filho não tiver um bom preparo nos estudo, se ele não cursar uma boa faculdade, se não tiver um bom diploma, com o que ele vai viver? Com o que ele vai viver?

O Rosh Yeshivá, olhando nos olhos do pai do rapaz, respondeu.

- E se seu filho não tiver uma boa educação judaica, se ele não souber como cumprir Mitzvót e fazer bons atos, com o que ele vai morrer? Com o que ele vai morrer?"

Nos preocupamos demais com nossos estudos e o nosso sustento nesta vida, que não dura mais do que 120 anos. Será que também nos preocupamos com o sustento que levaremos para a nossa vida eterna no Mundo Vindouro? (História Real)

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Nesta semana lemos duas Parashiot juntas, Tazria e Metzorá, e ambas tratam de uma doença espiritual chamada Tzaráat, que causava manchas na pele da pessoa contaminada. Ela deveria então passar por um processo de isolamento fora do acampamento do povo judeu até os sinais da doença terminarem e precisava completar sua "cura espiritual" oferecendo um Korban (sacrifício), como está escrito: "E sairá o Cohen (sacerdote) do acampamento, e verá o Cohen, e eis que foi curada a praga da Tzaráat daquele que tinha Tzaráat. E ordenará o Cohen, e tomará para aquele que vai ser purificado dois pássaros vivos e puros, madeira de cedro, carmesim e hissopo" (Vayikrá 14:3,4). Cada um dos elementos do Korban representa algo sobre as causas da Tzaráat. O que representam os pássaros?

Ensinam os nossos sábios que a Tzaráat vinha por 3 diferentes motivos: por Lashon Hará (falar mal de outra pessoa), por causa do orgulho e por causa do desejo descontrolado por dinheiro e bens materiais. Portanto, os pássaros vinham dar uma "dica" do porque a pessoa tinha sido contagiada pela Tzaráat. Os filhotes de pássaro ficam o tempo todo abrindo a boca e piando. Assim também são aqueles que falam demais, muitas vezes sem pensar o que vão dizer, e acabam falando Lashon Hará. Outra característica dos pássaros é que eles estão sempre sobre os outros animais. Assim também se comportam as pessoas orgulhosas, que se consideram sempre acima das outras pessoas. E finalmente os pássaros, apesar de passarem alguns momentos caminhando sobre o chão, podem a qualquer momento levantar vôo e ir embora. Assim é aquele que deseja muito o dinheiro e os bens materiais. Ele se esquece que nossas propriedades podem "voar", que em um momento temos tudo em nossas mãos, mas podemos perder tudo em um instante. Mas afinal, qual a relação entre as 3 causas do Tzaráat, que aparentemente parecem motivos tão diferentes?

Quando D'us criou o ser humano, o fez por bondade. Nossa alma foi colocada dentro de um corpo para que, durante os anos de vida neste mundo, possamos utilizar nosso livre-arbítrio para fazer o bem e assim acumular méritos com os nossos bons atos. Apesar de termos muitos prazeres neste mundo, o propósito da criação não são estes prazeres, que são na verdade de pequena intensidade. Os verdadeiros prazeres, os prazeres espirituais, estão guardados para o Olam Habá (Mundo Vindouro). Então para que D'us criou os prazeres do mundo material? Por um lado para servirem como um teste e nos darem méritos quando conseguimos tomar as decisões corretas mesmo quando vão contra as nossas vontades, e por outro lado para serem utilizadas como ferramentas para que nosso trabalho espiritual neste mundo possa ser realizado. Por exemplo, é uma Mitzvá comermos refeições gostosas no Shabat, pois assim estamos utilizando o mundo material como um meio para nos elevarmos espiritualmente.

Portanto, a pessoa que tem um desejo incontrolável por dinheiro demonstra que não entendeu o propósito da vida, não entendeu que esta vida é passageira e que o mais importante é o que estamos acumulando para a eternidade através dos nossos bons atos. Quando a pessoa não entende que o espiritual é mais importante que o material, ela começa a sentir que suas posses a transformam em uma pessoa melhor que os outros e começa a sentir orgulho. E finalmente, por se sentir melhor do que os outros, se acha no direito de menosprezá-los, chegando ao Lashon Hará. Por isso, quando perdemos o foco de que a vida material é apenas passageira, acabamos nos tornando pessoas orgulhosas, que falam Lashon Hará dos outros e se tornam obstinadas em conquistar seus desejos materiais.

Um dos principais efeitos psicológicos de se trazer um Korban era o momento em que o animal oferecido era morto. Isso causava no transgressor um mal-estar, pois sentia que na verdade era ele mesmo quem deveria estar morrendo pelos seus pecados. O pensamento da morte fazia com que a pessoa se arrependesse e despertasse. Muitas vezes negligenciamos nossa vida espiritual ao investir demais na nossa vida material pois nos esquecemos que ela é finita, que um dia tudo isso terminará. Muitas vezes nos sentimos melhores do que os outros porque nos esquecemos que, no final, todos voltaremos ao mesmo pó, tanto o rico quanto o pobre, tanto o sábio quanto o tolo, tanto o belo quanto o feio. É o que nos ensina Shlomo Hamelech (Rei Salomão): "É melhor ir ao cemitério do que ir a uma festa" (Kohelet 7:2). Quando vamos ao cemitério, despertamos para a vida. Lembramos que um dia tudo isso vai chegar ao fim. Tudo o que juntamos de bens materiais, todos os esforços materiais que fizemos nesta vida ficarão aqui, nada levaremos para a eternidade. A única coisa que levaremos são as nossas Mitzvót e os nossos bons atos.

Se quisermos nos tornar pessoas melhores e, ao mesmo tempo, acumular "bens" espirituais para o Mundo Vindouro, a única maneira é estudando, conhecendo e cumprindo a nossa Torá. Se sempre encontramos tempo para investimentos limitados de 120 anos, não encontraremos tempo para investimentos eternos?

SHABAT SHALOM

Rav Efraim Birbojm