Nesta semana o Shabat coincide com uma das Festas mais importantes do calendário judaico: Pessach, também conhecida como "A Festa da nossa liberdade". É importante focar na liberdade que ocorreu no passado, quando D'us nos libertou da dura escravidão egípcia, mas também não podemos esquecer que, em certas áreas da vida, também somos escravos e precisamos da ajuda de D'us para sermos libertados novamente. Durante todo o ano lembramos duas vezes por dia do evento da Saída do Egito, no terceiro parágrafo do Shemá Israel. Porém, há também outra Mitzvá, de contar sobre a Saída do Egito, que é cumprida especificamente na noite do Seder de Pessach. Qual é a diferença entre estas duas Mitzvót? Nossos sábios explicam que há principalmente três diferenças entre estas duas Mitzvót. Enquanto a Mitzvá da recordação diária pode ser cumprida simplesmente mencionando a Saída do Egito, a Mitzvá de contar sobre a Saída do Egito na noite do Seder tem algumas outras exigências. Em primeiro lugar, ela deve ser feita através de perguntas e respostas. Por exemplo, o filho pergunta "Má Nishtaná" e o pai responde "Avadim Hainu". Além disso, é necessário contar não apenas a Saída do Egito, mas todos os eventos que a precederam, começando da parte negativa, tanto fisicamente ("Avadim Hainu") quanto espiritualmente ("Ovdei Avodá Zará Haiu Avoteinu"), e terminando com a parte positiva. Finalmente, também devem ser explicados os motivos das Mitzvót que cumprimos nesta noite, como nos ensina Raban Gamliel, que aquele que não mencionou "Pessach, Matsá e Maror" com suas devidas explicações não cumpriu sua obrigação. Mas o conceito de perguntas e respostas não é apenas um detalhe "técnico" da Mitzvá de contar sobre a Saída do Egito. Na verdade, isso é parte fundamental da Festa de Pessach, pois a liberdade verdadeira começa através do questionamento, da busca pela verdade. O judaísmo encoraja o questionamento e a reflexão. No entanto, deve ser um questionamento com a intenção sincera de aprender e adquirir conhecimento, e não de provocação ou zombaria. E é esse o ponto principal de uma das partes centrais do nosso Seder de Pessach: as perguntas dos quatro filhos da Hagadá, isto é, o Chacham (sábio), o Rashá (perverso), o Tam (ingênuo) e o Sheinô Iodeia Lishol (que não sabe perguntar). Os quatro filhos trazem questionamentos que nos ensinam lições importantes. O Chacham é o primeiro a perguntar. O que ele questiona? Por que tantas e tão variadas Mitzvót estão relacionadas à Saída do Egito? A expressão "Lembrança da Saída do Egito" é repetida 50 vezes na Torá. Repetimos esta mesma expressão em todas as outras Festas e em outros momentos importantes da nossa vida. Em outras palavras, o Chacham questiona: o que há de tão significativo nesse acontecimento histórico, que justifique sua lembrança em todas as facetas da vida cotidiana? A resposta ao Chacham é: "Você não pode comer mais nada depois de ter comido o Korban Pessach". Por quê? Pois o Korban Pessach é o símbolo da libertação espiritual. A oferenda do Korban Pessach representa nossa rejeição da idolatria, com todo o seu materialismo e busca de prazeres inerentes. Portanto, deve-se permitir que o sabor desta liberdade espiritual permaneça, e devemos saboreá-la enquanto ela durar. Há muitos prazeres que despertam nossa tentação, e devemos estar cientes de que sabores agradáveis do mundo material podem obscurecer o sabor da nossa preciosa liberdade espiritual e, portanto, devemos tomar cuidado. Os prazeres físicos podem ser tão sedutores que às vezes chegamos a correr o risco de abrir mão da nossa espiritualidade por eles. Portanto, para nos protegermos, precisamos ser constantemente lembrados da Saída do Egito. Já o perverso, o segundo a perguntar, não questiona para saber e entender. Sua mente está fechada, pois ele já tomou suas decisões. Ele prefere os prazeres materiais ao invés dos esforços espirituais, e sua atitude é: "Quem precisa de todo esse ritual, afinal? Se você deseja celebrar Pessach como um dia de independência e liberdade, faça-o com um desfile, piquenique e fogos de artifício, e depois vá viver a vida, e não pense mais nisso até o próximo ano!" Isso não é uma pergunta, mas sim um ataque, um desafio. Há pouco valor em tentar argumentar com uma pessoa assim, porque ela não quer ouvir. Então dizemos para ela: "Houveram pessoas como você no Egito que se recusou a seguir Moshé no deserto, e acabaram ficando para sempre no Egito. Houveram também aqueles que partiram com Moshé, mas recaíram na idolatria com o Bezerro de Ouro. E houve quem se queixasse do Man, dizendo: "Gostaríamos de estar de volta ao Egito, quando tínhamos peixe, cebola, alho e melão". Havia também aqueles que diziam: "Vamos nomear um novo líder e retornar ao Egito". Em outras palavras, dizemos de forma dura ao filho perverso: "Se você estivesse lá, apesar da possibilidade de sair do Egito junto com todos os outros, você teria trocado facilmente a liberdade preciosa e duramente conquistada por prazeres físicas. Você está muito mais interessado em alimentar seu estômago do que em nutrir sua alma". O terceiro filho, o ingênuo, contrasta com o Chacham, aquele que entende o valor da liberdade espiritual. O ingênuo tem uma única pergunta: "De que maneira a Saída do Egito está relacionada com tantas Mitzvót variadas?". Ele fica impressionado com todo o ritual de Pessach. Ele não rejeita as Mitzvót, como o filho perverso. Em sua perplexidade, ele apenas pergunta com sinceridade: "Para que serve tudo isso?". Pelo seu interesse e honestidade, ele merece uma resposta. A resposta que damos é: "D'us nos livrou da escravidão egípcia com Mão forte". Isso não se refere apenas a forçar o Faraó a libertar o povo judeu, mas também ao fato de que mesmo muitos judeus tiveram que ser forçados a deixar o Egito. Moshé teve que convencer os escravos judeus de que a liberdade era preferível à escravização, mas nem todos os judeus conseguiram absorver esta mensagem. Portanto, explicamos à pessoa ingênua que ainda hoje existem muitas pessoas que podem se adaptar ao comodismo e cujo objetivo principal na vida é estarem confortáveis. Essas pessoas podem rejeitar a mensagem de se libertar da tirania de seus impulsos físicos. Precisamos ensiná-las que lutar pela espiritualidade, mesmo que isso possa interferir na nossa tranquilidade, é o nosso objetivo principal, e é o que torna o homem digno de ter sido criado à imagem Divina. A pessoa ingênua, pelo fato de estar ao menos atenta para questionar, pode aceitar esta resposta e estar disposta a investir em uma vida espiritual. Finalmente, há um quarto filho que, apesar de participar do Seder e observar todos os rituais, não sabe nem mesmo questionar. Portanto, nós devemos iniciar o assunto por ele. Mas por que nos preocupamos com ele? Se ele já chegou ao ponto de nem mesmo saber perguntar, é porque realmente não se interessa mais! Mesmo assim a Hagadá está nos ensinando que ainda há pureza no coração dele. Apesar de ele não entender nada, ele está participando do Seder. Muitas vezes a pessoa está afastada da espiritualidade, mas consegue manter seu coração puro e sincero, bastando uma pequena faísca para reacendê-lo. É o caso de tantos Baalei Teshuvá da nossa geração, que após algum "estalo", voltam com alegria sincera para o caminho de Torá e Mitzvót. Obviamente que apenas a pureza do coração não é suficiente para que nosso serviço para D'us seja completo. Por outro lado, uma das maiores armas do nosso Yetser Hará é nos fazer acostumar com as Mitzvót, a ponto de passarmos o dia inteiro cumprindo-as, porém absolutamente sem nenhum tipo de conexão com D'us. Isso também é uma forma de escravidão e comodismo. A Festa de Pessach é a oportunidade de despertarmos, de questionarmos, de sairmos da nossa escravidão particular. Que possamos aproveitar a oportunidade. SHABAT SHALOM E CHAG SAMEACH R' Efraim Birbojm |