sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

SHABAT SHALOM MAIL - PARASHÁ ITRÓ 5770

BS"D

APENAS UM VIAJANTE - PARASHÁ ITRÓ 5770 (05 de fevereiro de 2010)

"O Rabino Eliahu Dessler foi um dos grandes rabinos de sua geração. Certa vez ele foi acompanhar um de seus alunos que estava indo embora da Yeshivá (Centro de estudos judaicos), pois sua família havia decidido morar em outro país. Conversaram durante todo o caminho até chegarem na estação de trem. No momento da despedida, o aluno pediu ao rabino uma Brachá (benção). O Rav Dessler segurou a mão do aluno, fechou os olhos e disse:

- Eu desejo do fundo do meu coração que você faça uma viagem confortável e sem problemas.

Quando o Rav Dessler abriu novamente os olhos, percebeu que o aluno parecia um pouco desapontado. Perguntou se havia algo errado e o aluno respondeu:

- Quando eu pedi uma Brachá, tinha a esperança que você me daria uma Brachá que me acompanhasse pelo resto da vida. Mas você apenas me desejou uma boa viagem!

O Rav Dessler entendeu o motivo da tristeza de seu aluno, abriu um sorriso e explicou:

- Acho que você não entendeu a Brachá que eu lhe dei. Eu te dei uma Brachá que é também um ensinamento para você levar como bagagem para onde você for. A viagem que eu me referia é a viagem da sua vida. Eu queria apenas te lembrar que estamos aqui neste mundo como passageiros em trânsito, em uma viagem que nos leva ao Olam Habá (Mundo Vindouro), o nosso destino final. O que eu te desejei foi que durante toda a sua vida você possa fazer esta viagem de forma tranqüila e sem dificuldades".

Muitas vezes nos esquecemos que somos apenas passageiros nesta vida, nossa passagem aqui neste mundo é apenas temporária. Aqui não é o ponto final, é apenas uma estação provisória.

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Nas Parashiot anteriores vimos que, apesar de Moshé Rabeinu ter sido criado na casa do faraó, com luxo e fartura, ele nunca esqueceu seus irmãos judeus que estavam imersos em sofrimentos. E quando ele viu que um egípcio golpeava um judeu sem piedade, matou o egípcio e escondeu seu corpo sob a areia do deserto. Mas Moshé foi delatado ao faraó, que ficou furioso e tentou matá-lo com uma espada. D'us então fez um grande milagre e salvou Moshé, que conseguiu fugir do Egito e se esconder em Midian. Lá Moshé conheceu Tzipora, filha de Itró, o sacerdote idólatra de Midian. Eles se casaram e tiveram dois filhos, Guershom e Eliezer. Então D'us se revelou para Moshé no arbusto ardente que não se consumia e o comandou a voltar ao Egito para salvar o povo judeu. Ele deixou sua família protegida em Midian, sob os cuidados de Itró, e foi ao Egito salvar seus irmãos.

A Parashá desta semana, Itró, começa justamente no reencontro de Moshé com sua família. Após ter escutado todos os milagres que D'us havia feito ao povo judeu, Itró levou Tzipora e seus filhos ao encontro de Moshé no deserto. A Torá então explica o porquê dos nomes que Moshé deu aos seus filhos: "E os dois filhos dela, cujo nome de um deles era Guershom, pois ele (Moshé) disse "fui um peregrino (do hebraico "Guer") em uma terra estranha"; e o nome do outro era Eliezer, pois "o D'us de meu pai veio em minha ajuda (do hebraico "Ezer"), e Ele me salvou da espada do faraó" (Shemot 18:2-4).

Mas surgem algumas dúvidas sobre os nomes escolhidos por Moshé. Entendemos o nome dado a Eliezer, que foi na verdade um agradecimento à salvação milagrosa de D'us. Mas qual foi o propósito de dar o nome Guershom ao seu outro filho, ressaltando que ele era apenas um residente temporário em uma terra estranha? Além disso, Moshé deveria ter chamado seu primeiro filho de Eliezer e não o segundo, pois ele foi salvo da espada do faraó antes de ter se tornado um peregrino em Midian. Por que ele inverteu a ordem?

Explica o Chafetz Chaim que quando Moshé estava em Midian, ele olhou em volta e percebeu que era a única pessoa do lugar que acreditava em D'us. Mesmo Itró, seu sogro, que futuramente se converteu ao judaísmo, naquele momento ainda era um sacerdote idólatra, e apenas quando D'us fez todos os milagres da saída do Egito é que ele despertou e deixou de acreditar na tolice de servir estátuas. Moshé, por estar completamente sozinho, teve medo de ser influenciado pelos atos e idéias das pessoas que estavam à sua volta. Por isso, logo que seu primeiro filho nasceu, ele escolheu um nome que seria constantemente um lembrete para que ele não se desviasse dos caminhos corretos. Mas como o nome Guershom podia ajudar a protegê-lo? O que ser um peregrino o ajudava a não transgredir?

Diz Shlomo Hamelech (Rei Salomão), o mais sábio de todos os homens: "Os vivos sabem que vão morrer, os mortos não sabem de nada" (Kohelet - Eclesiastes 9:5). O que significa este versículo? Afinal, todos os vivos sabem que vão morrer algum dia, e é óbvio que os mortos não sabem de nada, pois já morreram! Explicam os nossos sábios que "vivos" se refere aos Tzadikim (Justos), pois mesmo depois que morrem seus bons atos ficam aqui para sempre, é como se ainda estivessem vivos. "Mortos" se refere aos Reshaim (malvados), cujos maus atos fazem com que fosse melhor que nem tivessem vindo ao mundo. Shlomo Hamelech está ensinando que os Tzadikim são aqueles que sabem que vão morrer, isto é, colocam no coração a idéia de que esta vida é apenas passageira, que temos um tempo limitado para cumprir o nosso papel e poder meritar o Mundo Vindouro, e com isso não cometem transgressões. Já os Reshaim são aqueles que não sabem que vão morrer, isto é, não colocam no coração que esta vida é passageira, vivem como se nunca fossem morrer e por isso acabam cometendo transgressões e não aproveitando as oportunidades espirituais.

Moshé, com medo de cair espiritualmente enquanto estava em Midian, queria a todo momento um lembrete de que a vida é passageira, para que pudesse focar no seu trabalho espiritual e não se deixar desviar. Por isso, apesar de estar imensamente agradecido por D'us pela salvação milagrosa, ele preferiu colocar o nome do primeiro filho de Guershom. Quando Moshé falou "fui um peregrino em uma terra estranha" ele não estava se referindo a ser um residente temporário na terra de Midian. Ele se referia a ser um residente temporário neste mundo material, que é uma terra estranha, não é a nossa moradia final. O nome do filho seria constantemente um aviso de que sua permanência neste mundo era limitada, para que ele não se corrompesse com os maus atos das pessoas ao seu redor.

Quando uma pessoa está viajando, não se importa se precisa comer um pouco menos, se precisa dormir um pouco menos ou se precisa ficar com menos conforto. Como o tempo da viagem é limitado, a pessoa quer aproveitar cada segundo, e abre mão de muitas coisas em troca do seu objetivo. Este é o grande ensinamento de Moshé Rabeinu para nossas vidas: colocar no coração a idéia de que esta vida é algo apenas passageiro nos ajuda a evitar transgressões, nos ajuda a definir o que é o importante e o que é secundário, nos ajuda a manter o foco no nosso trabalho verdadeiro. Não viemos para este mundo em busca de "Carpe Diem" (aproveitar a vida a todo custo), pois a vida verdadeira não é esta. Podemos e devemos ter prazeres na vida, mas canalizados para que possamos atingir nossos objetivos.

Estamos no meio de uma grande viagem, cada fase de nossas vidas é uma estação pela qual passamos em direção ao nosso destino final. Se conseguirmos colocar esta idéia no coração, de que tudo isso é apenas passageiro, teremos muito mais Brachá em nossas vidas e poderemos fazer esta viagem de maneira tranqüila e agradável.

"O tempo é curto, o trabalho é longo, os trabalhadores são preguiçosos e o dono da casa pressiona" (Pirkei Avót)

SHABAT SHALOM

Rav Efraim Birbojm