sexta-feira, 14 de novembro de 2008

SHABAT SHALOM MAIL - PARASHÁ VAIERÁ 5769

BS"D

TZADIK ÀS CUSTAS DOS OUTROS? - PARASHÁ VAIERÁ 5769 (14 de novembro de 2008)

"O rabino Israel Salanter era um homem muito santo e rigoroso com o cumprimento das Mitzvót. Certa vez ele foi convidado por um de seus alunos para o jantar de Shabat. O rabino explicou ao aluno que nunca aceitava um convite antes de saber os detalhes dos costumes da casa. O aluno começou a explicar:

- Na minha casa tudo é feito com todo o rigor da Halachá (lei judaica). A carne é comprada em um açougue cujo dono é conhecido como um homem muito temente a D'us. A comida é preparada por uma senhora muito séria, viúva de um grande estudioso de Torá. Fora isso minha esposa passa o tempo todo supervisionando o preparo de cada comida. A mesa é caprichosamente arrumada para o jantar e entre um prato e outro nós conversamos sobre a Parashá da semana e estudamos Halachót (leis). Fora isso também cantamos músicas de Shabat e a prazeirosa refeição costuma ir até altas horas.

Depois de escutar todos os detalhes, o Rav Salanter aceitou o convite, mas com a condição que o jantar não se estendesse tanto. O aluno atendeu o pedido do rabino, acelerou bastante o jantar e bem cedo já estavam fazendo a reza final. Após a reza o aluno virou-se para o Rav Salanter e perguntou:

- E então, o Rav encontrou alguma falha no meu Shabat?

O Rav Salanter não respondeu, ao invés disso pediu para que aquela cozinheira viúva fosse chamada. Quando ela chegou na sala, o Rav Salanter pediu perdão por tê-la cansado mais do que o normal ao mudar os costumes da casa e acelerar a refeição. A cozinheira abriu um sorriso e disse:

- Ao contrário, rabino, que você seja abençoado e possa passar todas as refeições de Shabat aqui nesta casa. Todo Shabat a refeição costuma ir até muito tarde. Eu trabalho o dia inteiro, começo cedinho de manhã, chega um momento que minhas pernas latejam e o cansaço me consome. Mas hoje, graças ao rabino, eu poderei voltar cedo para casa e descansar um pouco.

Quando escutou estas palavras, o Rav Salanter virou-se para o seu aluno e falou:

- Aqui está a resposta da sua pergunta. Seu Shabat é realmente muito bonito, mas é isso que D'us quer, uma Mitzvá às custas da saúde de uma viúva? O seu Shabat somente será bom quando for bom para todos também!"

Muitas vezes temos tanta sede de crescer que esquecemos de olhar em volta para nos certificar de que não estamos pisando em ninguém.
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A Parashá desta semana, Vaierá, nos mostra a força espiritual descomunal de Avraham Avinu. Apesar de ter feito um doloroso Brit-Milá aos 99 anos, sem nenhum tipo de anestesia, todo o seu pensamento estava apenas concentrado em fazer bondades aos outros. Mesmo doente, ele insistia em receber convidados em sua casa. Mas os planos de D'us eram outros, pois Ele queria que Avraham descansasse para poder se recuperar. D'us fez com que o dia se tornasse insuportavelmente quente, a ponto de nenhum viajante se aventurar a sair de casa. Vendo que estranhamente não passava nenhum visitante, Avraham mandou seu servo Eliezer procurar viajantes no caminho, mas ele não encontrou ninguém. Avraham não desistiu e mesmo com terríveis dores foi para a porta de casa, na esperança de enxergar viajantes no caminho. D'us entendeu que doía mais para Avraham não receber convidados do que as terríveis dores do Brit-Milá e por isso mandou para ele 3 anjos disfarçados de beduínos, para que Avraham pudesse cumprir a Mitzvá de Achnassat Orchim (receber convidados).

A Parashá descreve todo o esforço de Avraham para agradar os beduínos e recebê-los da melhor forma possível. Ofereceu-lhes comida, bebida e descanso na sombra. E tudo o que Avraham ofereceu aos beduínos, ofereceu com abundância. Serviu leite e manteiga, pães, bolos e carne à vontade. Mas há algo estranho, porque quando ele ofereceu água para que lavassem os pés, ofereceu pouco, como está escrito "Que seja trazido um pouco de água..." (Bereshit 18:4). Por que? Será que Avraham não queria gastar muito com os convidados pois era uma pessoa econômica?

Nossos sábios ensinam justamente o contrário, que Avraham não media gastos para receber bem seus convidados. Por exemplo, o Talmud conta que Avraham não preparou apenas um boi para servir aos visitante, e sim três bois. Mas por que três bois para apenas três pessoas? Rashi, comentarista da Torá, explica que Avraham quis servir para cada um dos viajantes um prato típico de reis: língua com mostarda, uma língua para cada beduíno. Portanto, se Avraham era uma pessoa tão generosa, por que ele ofereceu pouca água?

Explica o livro "Lekach Tov" que nem todas as coisas foi Avraham quem trouxe sozinho. O leite e a manteiga, os bolos e a carne foram trazidos por ele, mas a água Avraham preferiu pedir para seu filho Ishmael trazer, não por preguiça, e sim como uma forma de ensiná-lo a importância de fazer Chessed (bondade).

Podemos enxergar a grandeza de Avraham não apenas nos seus atos de Chessed, mas também na sua preocupação com os outros. O que Avraham fazia sozinho, ele recebia sobre si fazer o melhor possível e se esforçar ao máximo, e por isso trouxe com abundância. Mas o que ele pedia aos outros, era cuidadoso para não sobrecarregá-los. Por isso Avraham pediu para Ishmael apenas um pouco de água. Avraham era muito Tzadik, mas não queria que seus bons atos fossem construídos sobre o esforço dos outros. E isso devemos aprender para nossas vidas, se queremos fazer bons atos, que façamos com o nosso esforço e não sobrecarregando outras pessoas. Assim nos ensina o Pirkei Avót (Ética dos Patriarcas): "Todo aquele com quem as pessoas estão contentes, D'us também está contente com ele; e todo aquele com quem as pessoas não estão contentes, D'us também não está contente com ele" (Avót 3:10). Em outras palavras, de nada adianta fazer bons atos às custas de outras pessoas, pois se elas não estiverem contentes conosco, D'us também não estará.

Há um outro ensinamento importante que aprendemos dos atos de Avraham Avinu. Somos extremamente rigorosos com os outros, constantemente questionamos os atos das outras pessoas e esperamos que todos se comportem de maneira perfeita e exemplar. Mas ao contrário, quando se trata de nós mesmos, somos lenientes e estamos sempre buscando justificativas para os nossos atos. Avraham nos ensinou o contrário, a ser rigorosos conosco, buscando cada vez melhorar mais para chegar na perfeição, porém ao mesmo tempo ser lenientes com os outros, respeitando os limites de cada um. Desta forma não apenas as outras pessoas estarão contentes conosco, mas D'us também estará.

"Toda vez que apontamos o dedo para alguém, 3 dedos ficam apontados para nós mesmos"

SHABAT SHALOM

Rav Efraim Birbojm