| Na Parashá desta semana, Miketz (literalmente "Ao fim de"), a Torá continua contando sobre a saga de Yossef, em seus altos e baixos. No fim da Parashá da semana passada, após dez anos na cadeia, preso injustamente por uma falsa acusação de assédio, Yossef teve uma oportunidade para ser libertado ao interpretar corretamente os sonhos do copeiro-chefe. Ao interpretar que o copeiro-chefe seria restituído ao seu cargo e voltaria a servir bebidas ao Faraó, Yossef pediu que fosse mencionado ao Faraó que ele havia sido preso injustamente. A Parashá então terminou dizendo que no aniversário do Faraó, o copeiro-chefe foi julgado e inocentado, voltando ao seu cargo original, exatamente como Yossef havia interpretado. Porém, o copeiro-chefe se esqueceu de Yossef. A nossa Parashá começa exatamente dois anos depois destes eventos, como está escrito: "E aconteceu que, ao fim de dois anos completos, o Faraó teve um sonho" (Bereshit 41:1). Desse sonho do Faraó veio finalmente a salvação de Yossef, que foi chamado para interpretá-lo e depois elevado a vice-rei do Egito. Mas por que a Torá conectou os dois assuntos? Para nos ensinar que tudo ocorre de acordo com a vontade de D'us. Yossef recebeu um castigo Divino de passar 10 anos na cadeia por ter falado ao pai Lashon Hará sobre os seus 10 irmãos, apesar de ter feito isso com boas intenções. O evento com o copeiro-chefe ocorreu justamente ao fim dos 10 anos. Isso significa que o sonho do Faraó deveria ter acontecido imediatamente e Yossef deveria ter sido tirado naquele momento da prisão. Então por que a nossa Parashá começa nos ensinando que se passaram mais dois anos até que Yossef fosse libertado, se espiritualmente o castigo havia terminado? A resposta está no entendimento mais profundo das palavras de David Hamelech: "Bem-aventurado é o homem que coloca em D'us a sua confiança e não se volta para os arrogantes" (Tehilim 40:5). De acordo com o Midrash, "o homem que coloca em D'us a sua confiança" se refere a Yossef, que tinha uma confiança em D'us inabalável. A maioria das pessoas teria desabado com os testes de Yossef, mas ele se manteve firme justamente porque confiava plenamente em D'us e via a Mão Dele em tudo o que ocorria, até mesmo nas dificuldades. Porém, de acordo com o Midrash a continuação do versículo "e não se volta para os arrogantes" se refere a Yossef ter pedido ajuda ao copeiro-chefe e falado "Mas lembre-se de mim quando as coisas correrem bem para você, e por favor, faça-me um favor e mencione meu nome ao Faraó, e você me tirará desta casa" (Bereshit 40:14). Por ter se apoiado em um humano e não em D'us, e utilizado duas expressões, foram-lhe acrescentados dois anos na prisão. Porém, há aqui uma aparente contradição. Inicialmente o Midrash descreve Yossef como o exemplo de alguém sobre quem se aplica o versículo "Bem-aventurado é o homem que coloca em D'us a sua confiança", mas logo em seguida afirma que ele foi punido por falta de confiança em D'us! Afinal, ele confiava em D'us ou não? Além disso, por que Yossef foi punido por ter pedido ajuda ao copeiro-chefe? Afinal, a Hishtadlut (esforço humano) é permitida, e até desejável. Que falha ele cometeu ao dizer "lembre-se de mim... mencione meu nome", a ponto de ser punido com um ano de prisão por cada expressão? Explica o Rav Yossef Dov Soloveitchik zt"l (Bielorrússia, 1820 - 1892), mais conhecido como Beit HaLevi, que de fato a Torá permite ao ser humano empenhar-se em suas necessidades materiais, como está escrito: "para que o Eterno, teu D'us, te abençoe em toda a obra das tuas mãos" (Devarim 24:19), isto é, a Brachá vem através do esforço. Também está escrito: "E recolherá o teu trigo, o teu vinho e o teu azeite" (Devarim 11:14). Sobre isso, diz o Talmud (Brachot 35b) em nome do Rabi Ishmael: "Se comporte de acordo com o costume do mundo", isto é, faça o esforço necessário. Mas e o Bitachon? Não devemos confiar que tudo vem de D'us? A resposta é que o ideal seria somente confiar em D'us, a ponto de não necessitar fazer nenhum tipo de esforço. Porém, nem todos conseguem alcançar este nível de confiança plena em D'us. A Hishtadlut serve, neste caso, como um auxílio para que a pessoa chegue ao nível de confiança verdadeira. E esse não é um conceito que se aplica apenas à Emuná. Encontramos em toda a Torá que, às vezes, certas condutas são permitidas como meio para ajudar o ser humano a alcançar um nível maior desejado. Assim ensinam os nossos sábios: "Sempre a pessoa deve se ocupar com a Torá e com as Mitzvót, mesmo sem as intenções mais puras ('Sheló Lishmá'), pois do 'Sheló Lishmá' se chega ao 'Lishmá' (intenções mais puras)". Conclui-se, portanto, que a medida do esforço permitido não é igual para todos, cada pessoa é avaliada segundo o seu nível. Se uma pessoa é capaz de confiar em D'us através de poucos esforços, todo acréscimo além do necessário será considerado uma falha no seu Bitachon. Por outro lado, quem ainda possui uma confiança limitada pode se dedicar mais ao esforço material, até conseguir tranquilizar o coração e confiar plenamente em D'us, e para ele o esforço adicional não será considerado uma falha. O que acontece quando a pessoa excede e faz um esforço além do que lhe é necessário de acordo como o seu nível? A punição vinda do Céu é que aumentam as circunstâncias que o obrigam a depender desse esforço, e seu sustento só chegará através de um enorme esforço, exatamente pelo caminho que a pessoa escolheu para si. Portanto, a pessoa que se apoiou no mundo material agora dependerá mais do seu esforço no mundo material. Com estes entendimentos podemos agora analisar a situação de Yossef. O esforço dele ao dizer ao copeiro-chefe "Lembre-se de mim" parece, à primeira vista, algo mínimo, pois trata-se apenas de algumas poucas palavras. Além disso, Yossef viu claramente que do Céu lhe foi concedida essa oportunidade, pois a prisão do copeiro-chefe e seu sonho pareciam ter ocorrido unicamente para possibilitar sua salvação. Mais ainda, as palavras de Yossef ao copeiro-chefe não parecem ser propriamente um pedido. Primeiro Yossef disse: "Dentro de três dias o Faraó levantará a tua cabeça e te restituirá ao teu cargo" (Bereshit 40:13), e depois acrescentou "Mas lembre-se de mim quando as coisas correrem bem para você, e por favor, faça-me um favor e mencione meu nome ao Faraó, e você me tirará desta casa". O Beit HaLevi explica que tudo fazia parte de uma previsão. Yossef estava revelando ao copeiro-chefe que o fato de seu destino ter se transformado, de morte para vida, era unicamente para que ele pudesse tirá-lo da prisão. Em seguida, explicou que assim aconteceria: o copeiro-chefe o mencionaria e o faria sair daquele lugar. Portanto, a Hishtadlut de Yossef foi algo ínfimo. Então por que ele foi castigado? Se mesmo por um esforço tão pequeno ainda assim Yossef foi punido, isso prova que o seu nível de confiança em D`us era extremamente elevado, pois somente para alguém em um grau tão alto de confiança esta Hishtadlut tão pequena seria considerada uma falha. É isso que o Midrash está nos ensinando: "Bem-aventurado é o homem que coloca em D'us a sua confiança" se refere a Yossef, que estava em um grau muito alto de confiança em D'us. "E não se volta para os arrogantes", ou seja, ele realmente confiava em D'us e não se voltava sequer com uma leve inclinação do coração às pessoas. Neste nível tão elevado de confiança em D'us, até duas curtas expressões, que apenas soam como Hishtadlut, foram passíveis de punição. Pela severidade da punição, aprendemos a grandeza do Bitachon de Yossef. Por isso foi dito: "Bem-aventurado é o homem". Foi isso também que aconteceu na história do Saba MiNovardok. Os membros do seu grupo estavam em um nível no qual não necessitavam de esforço excessivo para alcançar tranquilidade. Também aquele que se afastou deles estava, aparentemente, em um nível o qual se poderia exigir dele a "tranquilidade daquele que confia". Como ele não aceitou confiar e se voltou ao esforço humano, foi punido com a necessidade de muito esforço. Já seus companheiros, que confiaram, foram bem-sucedidos sem grandes esforços. Ser um Baal Bitachon como o Saba MiNovardok não cai do Céu, é necessário se esforçar, principalmente através do estudo e da reflexão, procurando enxergar a Mão de D'us em tudo o que acontece em nossas vidas. Quanto mais esforço fizemos para ter mais Bitachón, menos esforços precisaremos fazer no mundo material. SHABAT SHALOM E CHANUKA SAMEACH R' Efraim Birbojm |