Nesta semana lemos a Parashá Tetsavê (literalmente "E você ordenará"), que continua falando sobre o Mishkan. Porém, nesta semana, ao invés de falar da estrutura e dos utensílios, o foco da Parashá são as maravilhosas roupas do Cohen Gadol, feitas de materiais nobres como ouro, pedras preciosas e lãs tingidas. Mas por que era necessário tanto esplendor nas roupas do Cohen Gadol? Ele não deveria usar roupas simples, representando a humildade? A resposta é que, apesar de a humildade ser certamente o traço de caráter mais importante que devemos adquirir na vida, algumas vezes precisamos usar o lado do orgulho para coisas positivas. As roupas do Cohen Gadol eram esplendorosas para entendermos a importância do Serviço Divino e nunca o tratarmos com desprezo. O povo judeu também precisava reconhecer que Aharon e seus filhos estavam em um nível espiritual muito mais elevado e, por isso, eles estavam aptos a fazerem os Serviços Divinos. As roupas esplendorosas deixavam isso mais evidente para quem os olhasse, e até para eles mesmos, pois a forma como a pessoa aborda uma tarefa influencia a forma como ela vai executá-la. E isso não se aplica apenas ao Cohen Gadol, mas a cada um de nós. Após a entrega da Torá no Monte Sinai, o povo judeu se transformou nos transmissores da Torá e dos seus valores morais para o mundo inteiro, uma "Luz para as nações". As roupas esplendorosas do Cohen Gadol, portanto, nos ajudam a lembrar do nosso importante papel no mundo. Isso se conecta com uma lição importante que aprendemos da próxima parada do Calendário Judaico, a Festa de Purim, que começaremos a reviver na próxima segunda-feira de noite (06/março). Purim é a Festa mais alegre do nosso Calendário, na qual é inclusive Mitzvá sentirmos alegria ao comemorarmos a salvação do povo judeu diante do enorme perigo de extermínio, após o decreto de Haman, e a vitória sobre os nossos inimigos. Mas por que D'us permitiu que esta pessoa tão perversa, chamada Haman, subisse ao poder e quase nos exterminasse? Para respondermos esta pergunta, antes precisamos entender qual é a essência espiritual de Haman. Consta no Talmud (Chulin 139b) que há na Torá uma "dica" sobre Haman. Ele aparece na descrição da história de Adam Harishon, quando ele ainda estava no Gan Eden. Adam e Chava podiam comer as frutas de todas as árvores do Gan Eden, porém D'us proibiu que comessem apenas de uma determinada árvore, a "Árvore do conhecimento do bem e do mal". Quando D'us viu que eles haviam transgredido Sua ordem, Ele perguntou para Adam: "Você comeu da árvore que Eu te ordenei a não comer?" (Bereshit 3:11). As palavras "Hamin" (HaEtz) (da árvore) tem as mesmas letras do nome "Haman". Porém, parece um mero jogo de palavras. Afinal, qual é a ligação mais profunda entre os dois assuntos? Quando Haman foi elevado a Primeiro ministro do rei, todos lhe davam muita honra. Por onde ele passava, as pessoas se curvavam. Ele tinha tudo o que um ser humano pode desejar: dinheiro, poder e honra. Porém, ainda assim ele não estava satisfeito, e não se conteve em implicar com uma única pessoa, um judeu, que não se curvava para ele. Isso mostra o descontrole de Haman, e foi justamente este descontrole que acabou resultando em sua queda. Da mesma forma, Adam Harishon poderia comer de todas as árvores do Gan Eden e, mesmo assim, ele não se conteve e acabou comendo da única árvore que lhe era proibido. Essa é, portanto, a essência de Haman: a insatisfação e o desânimo. E é possível sentir essa essência negativa dentro de nós. Quantas vezes ficamos chateados quando não temos ou não conseguimos adquirir algo que desejamos muito? Se pudéssemos dar uma nota para o nível de satisfação que estamos sentindo atualmente, que nota daríamos? Suponhamos que a nota foi 7. Poderíamos fazer uma lista das coisas que faltaram para que a nota fosse 10. Depois, poderíamos fazer uma segunda lista, das coisas mais valiosas que temos na vida. Se pudéssemos trocar o que temos na primeira lista pelo que desejamos na segunda lista, faríamos isso? Obviamente que não. O que vale mais, as coisas que nos faltam ou as coisas que já temos? Certamente a lista das coisas que já temos na vida é muito mais valiosa. Então por que a nota não foi 10 desde o princípio? A resposta é o "veneno" que Haman e seu povo trouxeram ao mundo. Haman é chamado na Meguilá de "HaAgagui", isto é, descendente de Agag, o rei de Amalek. O povo de Amalek, os arqui-inimigos do povo judeu, tem como a sua principal essência a força de "esfriar", de tirar a empolgação, de nos fazer esquecer que somos parte de algo especial. Foi isso que eles fizeram na saída do Egito, quando nos atacaram pela primeira vez. Após séculos de escravidão, o povo judeu saiu do Egito de cabeça erguida, após presenciarem todos os milagres de D'us. O temor do povo judeu recaiu sobre todos os povos do mundo. Porém, Amalek nos atacou, com o único intuito de tirar a nossa empolgação. Lutar com o povo judeu, mesmo depois de todos os milagres, era o mesmo que anunciar: "Vocês não têm nada de especial, vocês são como qualquer um". O primeiro encontro de Amalek com o povo judeu foi um verdadeiro balde de água fria em nossas cabeças. Na história de Purim, descrita na Meguilat Ester, o grande sábio Mordechai proibiu que o povo judeu participasse do banquete de Achashverosh. O que havia de tão mal, já que a Meguilá diz explicitamente que tudo era feito de acordo com a vontade dos convidados, isto é, a comida era Kasher! Em primeiro lugar, obviamente não era um ambiente adequado. Que tipo de assuntos era falado na festa? Conversas fúteis, como a discussão sobre qual povo tem as mulheres mais bonitas. Não é este tipo de ambiente que nós devemos frequentar se quisermos manter a nossa santidade. Além disso, havia a proibição de beber o vinho que não foi fabricado ou manuseado pelos judeus, uma tentativa dos nossos sábios daquela geração de evitarem a possível assimilação que assombrava o povo judeu no primeiro grande exílio desde a saída do Egito. Porém, um dos principais motivos de Mordechai para não permitir a participação dos judeus na festa de Achashverosh era o próprio motivo da festa. De acordo com as profecias, o Beit Hamikdash seria reconstruído 70 anos após sua destruição. Achashverosh errou os cálculos e achou que a profecia não tinha se cumprido, e por isso comemorou. Para humilhar ainda mais os judeus, ele utilizou em sua festa os utensílios do Beit Hamikdash e vestiu as roupas do Cohen Gadol, profanando desta maneira os objetos mais sagrados do povo judeu. Certamente os judeus não deveriam participar daquela humilhação. Então por que eles foram? Pois eles não tinham mais autoestima, não se achavam mais especiais, achavam que após a destruição do Beit Hamikdash eles seriam parte dos outros povos. É por isso que, logo após o povo judeu ter participado daquela festa, apesar dos protestos de Mordechai, Haman subiu ao poder. Amalek vem para nos fazer esquecermos o que temos de único e especial. Amalek quer nos igualar a todos os outros povos, destruindo assim a nossa missão única e especial. Amalek quer apagar a nossa luz. Percebemos isso em uma tragédia que ainda nos dói até hoje. Alguns comentaristas explicam que os nazistas eram descendentes de Amalek. Isso pode ser percebido no grau de perversidade e em sua obstinação de exterminar os judeus. Nos Campos de Concentração, os nazistas tatuavam em nossos braços números, para nos desumanizar. Eles queriam nos mostrar que éramos apenas um número, "mais um tijolo na parede", queriam diminuir nossa importância. Purim ajuda a renovarmos nosso sentimento de alegria e orgulho por fazermos parte de algo especial e grandioso: um povo que se mantém vibrante ao longo da história, mesmo constantemente recebendo baldes de água fria. Se mantivermos nossos corações aquecidos e orgulhosos, espantaremos Amalek e sua má influência. SHABAT SHALOM E PURIM SAMEACH R' Efraim Birbojm |