quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

SHABAT SHALOM MAIL - PARASHÁ SHEMOT 5769

BS"D

MUITO OBRIGADO - PARASHÁ SHEMOT 5769 (16 de janeiro de 2009)

"Em um reino distante havia muita alegria e tranquilidade. Porém, um dia a paz foi quebrada por um grave crime. Um homem, descontente com um decreto de um dos ministros do rei, levantou-se contra ele e o matou. Imediatamente os guardas reais prenderam o homem e o levaram para o tribunal.

Diferentemente das outras vezes, o próprio rei presidiu o tribunal, pois achava que a decisão daquele julgamento poderia mudar o rumo da história do reinado. Escutou as acusações contra o assassino, escutou o que o homem tinha para dizer em sua defesa, e reuniu-se com seus conselheiros para discutir o caso. Uma hora depois o rei voltou com seu conselheiros, e o veredicto foi anunciado para o público que aguardava ansioso:

- O réu é declarado culpado pelo assassinato de um dos ministros do rei, e receberá a pena de morte.

Os habitantes do reino se agitaram. Apesar de saberem que o homem realmente era culpado pelo assassinato, sabiam que no reino não se aplicava a pena de morte. Por que o rei havia sido tão duro desta vez? O rei então explicou para os seus súditos:

- Realmente a pena aplicada foi dura, mas é porque o crime foi mais grave do que aparenta. Se uma pessoa tem a coragem de matar um ministro do rei por ter se desentendido com ele, no futuro também poderá tentar matar o próprio rei por qualquer discórdia. Por isso, me senti obrigado a dar uma punição exemplar"

Desta história aprendemos uma importante lição: a forma como nos comportamos com o próximo é a forma como nos comportamos com D'us.
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Nesta semana começamos o segundo livro da Torá, Shemot, que também é conhecido como "Sefer Hagalut Ve Hagueulá" (O livro do exílio e da redenção), por descrever a história do povo judeu desde a escravidão no Egito até a sua salvação física e espiritual. E na Parashá desta semana, Shemot, a Torá descreve que, apesar das boas vindas iniciais que o povo judeu recebeu nos dias de Yaacov e seus filhos, nas futuras gerações os egípcios começaram a tratar mal os judeus e finalmente os escravizaram. Mas com o grande nome que Yossef havia construído no Egito e tudo o que ele havia feito pelos egípcios, quem foi o faraó que teve o descaramento de fazer algo assim contra os judeus? A Torá nos dá a resposta: "E se levantou um novo rei sobre o Egito, que não conheceu Yossef" (Shemot 1:5).

Segundo uma das opiniões trazidas no Talmud, na verdade não era um faraó novo, e sim aquele mesmo faraó cujos sonhos foram decifrados por Yossef. Então por que está escrito "um novo rei"? Pois o faraó, que havia sido tão receptivo com Yossef e sua família, resolveu renovar seus decretos e criar leis contra os judeus. Mas segundo esta opinião do Talmud, se era o mesmo faraó da época de Yossef, então o que significa as palavras finais do versículo "que não conheceu Yossef"? E mais estranho ainda é que, no final da Parashá, quando Moshé Rabeinu foi falar com o faraó em nome de D'us para pedir a libertação do povo judeu, o faraó falou "Eu não sei quem é Hashem, e não vou libertar o povo judeu (Shemot 5:2)". Como pode ser que o mesmo faraó que conheceu Yossef não sabia quem é Hashem, se foi ele mesmo quem falou para Yossef, quando seus sonhos foram decifrados, "Já que Hashem revelou tudo isso para você" (Bereshit 41:39)?

Explica o Talmud que, segundo esta opinião, as palavras "que não conheceu Yossef" não querem dizer literalmente que eles não viveram na mesma época. O significado destas palavras é que o faraó se comportou como se não o tivesse conhecido. Apesar de ter presenciado a salvação de todo o povo egípcio através de Yossef, tanto na interpretação correta dos sonhos quanto no conselho de armazenar comida nos anos de fartura para alimentar todo o povo nos anos de seca, ele "esqueceu" quem foi Yossef e todas as bondades que ele fez aos egípcios, e se voltou contra os judeus.

Mas a pergunta continua, pois é possível entender que o faraó "esqueceu" quem foi Yossef, mas como é possível também ter esquecido quem é Hashem? A resposta é um fundamento muito importante ensinado pelos nossos sábios: aquele que nega a bondade que recebe de seu companheiro, no final também acabará negando as bondades recebidas de D'us; e aquele que nega as bondades recebidas de D'us é como se estivesse negando Sua existência".

Quando alguém nos faz uma bondade nos sentimos endividados. A própria expressão que dizemos, "Obrigado", implica que agora temos uma obrigação com quem nos fez o bem. É por isso que reconhecer a bondade que os outros nos fazem não é fácil, pois não gostamos de nos sentir endividados com ninguém. Preferimos muitas vezes "ignorar" algo de bom que recebemos. Para isso temos alguns "mecanismos", tais como considerar que a bondade não nos ajudou tanto, que a pessoa não fez mais do que sua obrigação ou que quem nos fez a bondade não precisou de esforço algum para fazê-lo e por isso não merece nenhum agradecimento.

A Torá nos ensina justamente o contrário. Temos que nos educar para reconhecer tudo o que os outros nos fazem de bom, e a principal ferramenta é sempre pensar "Ló Maguia Li Klum" (eu não mereço nada), isto é, tudo o que os outros nos fazem é uma grande bondade, até mesmo se recebem um salário para isso. O motorista de táxi recebe pela corrida, mas sem ele não chegaríamos na reunião importante. A empregada também recebe um salário, mas sem ela a casa não estaria limpa e arrumada.

Um dos principais fatores que levam ao reconhecimento de D'us é o reconhecimento de todas as bondades que Ele faz aos seres humanos. Recebemos uma abundância de Brachót (bençãos) Dele, como dizemos três vezes por dia na Amidá, a principal reza do judaísmo: "Agradecemos... por todos os milagres que ocorrem todos os dias conosco, e pelas maravilhas e bondades de todos os instantes". Porém, muitas vezes estas bondades passam despercebidas em nossas vidas. Por que não enxergamos que ocorrem milagres e bondades a cada instante? Por nosso costume de viver como se merecêssemos tudo, por vivermos com a impressão de que tudo o que necessitamos não é mais do que obrigação dos outros nos darem. E por não sabermos reconhecer o que as pessoas nos fazem de bom, por não conseguirmos sair desta "inércia", acabamos também não conseguindo enxergar o que D'us nos faz de bom. E isso é mais grave do que parece, pois não agradecer a D'us é, de certa forma, uma maneira de negar a Sua existência.

Não podemos mudar tudo de uma hora para outra, mas um bom começo é se educar para conseguir reconhecer pelo menos as bondades das pessoas mais próximas, que muitas vezes nos ajudam sem receber nada em troca e que são, infelizmente, as primeiras para quem esquecemos de dar o nosso reconhecimento. Quem tem um filho sabe o trabalho que dá cuidar, alimentar e educar. Quantas vezes já falamos um obrigado aos nossos pais? Quantas vezes já reconhecemos, em nossos corações, tudo o que eles nos fizeram de bom, por tantos anos? E quanto aos nossos maridos e esposas, sabemos dar valor a tudo o que se esforçam pelo nosso bem estar, ou achamos que não fazem mais do que suas obrigações? Quando vemos a comida pronta na mesa levamos em conta o esforço para comprar os ingredientes, para prepará-los e para arrumar os pratos, ou sentamos na mesa e comemos como reis que foram servidos por seus serviçais?

Pequenas mudanças no cotidiano, como por exemplo fazer com que seja mais constante o uso da expressão "muito obrigado", podem nos ajudar a, pouco a pouco, reconhecer também todos os milagres e maravilhas que D'us faz por nós a cada instante.

Shabat Shalom

Rav Efraim Birbojm