sexta-feira, 21 de novembro de 2008

SHABAT SHALOM MAIL - PARASHÁ CHAIEI SARÁ 5769


BS"D

VENCENDO A MÁ-INCLINAÇÃO - PARASHÁ CHAIEI SARÁ 5769 (21 de novembro de 2008)

"O rabino Israel Salanter viajava de trem até a cidade de Vilna. Apesar de já ser um dos maiores rabinos da geração, ele costumava viajar sozinho e vestindo roupas simples, detalhes que escondiam sua verdadeira importância. Ele viajava em um vagão especial para fumantes junto com um outro judeu, que também ia para Vilna. No meio da viagem o Rav Salanter acendeu um cigarro, mas imediatamente o outro judeu gritou, de forma desrespeitosa, para que o rabino apagasse o cigarro, argumentando que ele não suportava o cheiro. O Rav Salanter poderia ter explicado que aquele vagão era para fumantes, mas preferiu pedir desculpas e apagar o cigarro. Poucos minutos depois novos gritos daquele judeu ecoaram no vagão. Desta vez ele gritava com o Rav Salanter reclamando da janela aberta e do frio que entrava. Novamente o Rav Salanter poderia se justificar e explicar que a janela não havia sido aberta por ele, mas novamente preferiu pedir educadamente desculpas, levantar e fechar a janela.

Quando chegaram em Vilna, uma grande multidão esperava pelo Rav Salanter. O outro judeu, curioso, perguntou quem era a grande celebridade que estava naquele trem. Quando soube que aquele homem com quem tinha sido tão grosseiro era o grande Rav Salanter, ele quase desmaiou. Passou toda a noite sem dormir e logo de manhã foi até o hotel onde o rabino estava hospedado. Mas antes que pudesse começar a falar, o Rav Salanter abriu um sorriso e convidou-o, com uma voz suave, a sentar-se e tomar algo. Aquele judeu se surpreendeu tanto com a simpatia daquele rabino, com quem ele havia sido tão indelicado, que caiu no choro, e entre lágrimas pediu sinceramente perdão. O Rav Salanter falou para ele não se preocupar pois já o havia perdoado e não tinha guardado nenhum rancor no coração.

Começaram a conversar e o rabino descobriu que o jovem estava em Vilna para se submeter a uma prova necessária para receber a autorização para fazer Shchitá (abate Kasher de animais). O Rav Salanter fez de tudo para ajudá-lo a conseguir a autorização e abriu muitas portas para ele. Mas infelizmente no dia da prova o rapaz demonstrou que não tinha os conhecimentos necessários e foi reprovado. O rabino que aplicou a prova pensou que talvez o mau desempenho era consequência do cansaço da viagem, e por isso pediu para que ele descansasse e tentasse novamente dentro de poucos dias. O rapaz ficou arrasado, pensou em voltar imediatamente para casa e abandonar o sonho de ser um Shochet.

Assim que soube da reprovação, o Rav Salanter correu até a hospedaria onde estava o rapaz e convenceu-o a ficar e a tentar de novo. Conseguiu que um experiente Shochet da cidade estudasse com ele todas as Halachót (leis) e pagou ao jovem rapaz todos os custos da sua estadia na cidade. O jovem não desperdiçou a oportunidade, estudou com afinco e dedicação e novamente se submeteu à avaliação, sendo aprovado com louvor pelos maiores rabinos da cidade. Mas o Rav Salanter ainda não estava contente e não descansou até que conseguiu uma comunidade adequada onde aquele rapaz pudesse trabalhar e ter um bom sustento. Quando souberam de tudo que o Rav Salanter havia ajudado aquele rapaz, perguntaram: "Por que tanto?". O rabino explicou:

- Quando este jovem veio pedir perdão, respondi que eu o havia perdoado completamente e que não havia nenhum rancor, e realmente falei isso de todo o coração. Porém, como sei que sou apenas uma pessoa de carne e osso, fiquei com medo que algum nível de rancor pudesse ter ficado no meu coração. Por isso me esforcei tudo o que pude para fazer bondades com ele e retirar qualquer resquício de mágoa do coração"

Para vencer uma má inclinação não é suficiente apenas querer. É preciso se esforçar até conseguir.
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A Parashá desta semana, Chaiei Sara, conta que Avraham estava ficando velho e decidiu que era hora de procurar uma esposa para seu filho Itzchak. Como Avraham queria que Itzchak se casasse com alguém de sua família, ele enviou seu servo Eliezer até sua cidade natal com a missão de trazer de lá uma esposa para Itzchak. A Torá nos ensina que Eliezer conseguiu cumprir sua missão e voltou trazendo Rivka. Mas se prestarmos atenção nos detalhes, percebemos que o comportamento de Eliezer foi muito estranho.

Por exemplo, quando Eliezer chegou na cidade de Aram Naharaim ele parou com seus camelos ao lado de um poço e rezou para que D'us o ajudasse em sua missão. Mas por que a necessidade de rezar, ele não confiava na força espiritual de Avraham, que certamente já havia rezado muito para que tudo desse certo? Além disso, ao invés de ir diretamente procurar a família de Avraham, ele parou ao lado do poço e fez um estranho pedido para D'us. Ele fixou para D'us um sinal com o qual ele reconheceria a mulher certa para Itzchak. Quando alguma mulher viesse ao poço ele pediria água para ela, e caso ela desse água para ele e também oferecesse água aos camelos, seria o sinal de que era a pessoa certa. Rivka foi a primeira mulher que chegou ao poço e o sinal logo se cumpriu, pois ela serviu água para Eliezer e ofereceu também aos seus camelos. Eliezer imediatamente deu para ela as jóias que havia trazido como presente, sem perguntar se ela realmente era da família de Avraham. Por que ele nem mesmo perguntou o nome dela antes de dar as jóias? Se fosse a mulher errada, ele perderia todas as jóias!

Quando Eliezer chegou na casa de Rivka para conhecer os pais dela e pedir permissão para levá-la para casar-se com Itzchak, convidaram-no a entrar e ofereceram-lhe comida, mas novamente ele agiu de maneira estranha, recusando a comida e dizendo "Comerei apenas quando tiver dito tudo o que eu vim dizer". Por que ele não começou a comer e durante o almoço contou o que queria contar? Além disso, esta estranha pressa de Eliezer em terminar logo seu trabalho também foi percebida quando a mãe e o irmão de Rivka pediram para que ela ficasse mais algum tempo com eles e somente depois fosse casar-se com Itzchak, mas Eliezer não aceitou e exigiu que ela fosse imediatamente. Qual o problema se Rivka ficasse mais alguns dias com a família? Portanto, percebemos que Eliezer tentou fazer tudo de forma rápida, às vezes até de forma precipitada, como se precisasse terminar sua função urgentemente. Por que?

Explica o rabino Saba MiNovardok que Eliezer era conhecido não apenas por sua grande sabedoria, mas também por sua retidão e fidelidade a Avraham. Quando ele recebeu a função de buscar uma esposa para Itzchak, logo percebeu que tinha um grande dilema. Por um lado ele queria cumprir sua função de maneira exemplar, mas por outro lado percebeu que tinha "Neguiot" (interesses), isto é, havia algo no seu subconsciente capaz de atrapalhar seu trabalho: a vontade de casar Itzchak com sua própria filha. Ele sabia das qualidade de Itzchak e sonhava em um marido assim para sua filha, por isso entendeu que se deixasse sua natureza agir, começaria a ter preguiça e buscaria todas as oportunidades e desculpas para não cumprir sua missão.

Ensina o Rambam (Maimônides) que o ser humano deve andar, em relação às suas características, pelo caminho do meio e não ser um extremista. Por exemplo, em relação à doações de dinheiro, a pessoa não deve nem ser mesquinho nem esbanjador. Mas ensina o Rambam que quando uma pessoa sente que uma característica pendeu fortemente para um dos lados, ele deve se esforçar para ir ao outro extremo e assim conseguir voltar ao meio termo. Foi exatamente o que fez Eliezer quando sentiu que seus interesses podiam subornar os seus atos, lutou como um leão contra sua natureza, mesmo que fosse necessário ir ao extremo contrário, para que sua missão tivesse sucesso.

Apesar de saber que Avraham já tinha rezado, Eliezer pediu em especial para que D'us o protegesse e não o deixasse cair nas armadilhas de seus interesses. Quando ele viu em Rivka os sinais que havia pedido a D'us, imediatamente deu para ela as jóias, pois mesmo se não fosse a mulher certa e ele tivesse que pagar para Avraham o valor de todas as jóias, mesmo assim ele preferiu o risco de perder dinheiro do que o risco de ser enganado por suas vontades. Também por esse motivo Eliezer não quis comer antes de falar com os pais de Rivka, para não deixar nenhuma porta aberta para seus interesses interferirem. E finalmente quando a mãe e o irmão de Rivka pediram para que ela ficasse mais alguns dias com eles, Eliezer não aceitou, com medo que se ele aceitasse seria por causa de seus interesses

Eliezer nos ensinou a lutar contra os nossos interesses, os "subornos" que recebemos das nossas vontades, que muitas vezes nos impedem de fazer o que é correto. Quantas vezes o comodismo e o medo de perder prazeres nos faz continuar em caminhos que sabemos racionalmente estarem errados? Quantas desculpas buscamos para justificar nossos atos, quando a verdade está óbvia diante de nós? Para ter sucesso espiritual, não basta querer fazer o que é correto. É preciso lutar por isso.

"O pior cego é o que não quer ver"

SHABAT SHALOM

Rav Efraim Birbojm