Nesta semana começamos o último Livro da Torá, Devarim, no qual Moshé se despede do povo judeu em suas últimas cinco semanas de vida, quando o povo estava prestes a entrar em Eretz Israel. Moshé quis aproveitar aqueles últimos momentos para preparar o povo para os potenciais desafios que encontrariam. Parte da preparação foi recordar os principais acontecimentos dos quarenta anos em que passaram no deserto, repreendendo-os pelos erros cometidos, alguns muito graves e que tiveram consequências trágicas. A Parashá desta semana, Devarim (literalmente "Palavras"), começa enumerando uma lista de lugares pelos quais o povo judeu havia passado. Por que isso era necessário? O Midrash observa que todos estes nomes de lugares são, na realidade, alusões veladas à transgressões cometidas pelo povo judeu enquanto estavam no deserto. Por exemplo, "Di Zahav" refere-se ao bezerro de ouro ("Zahav" é ouro), enquanto "Mul Suf" refere-se à reclamação dos judeus quando estavam diante do Mar Vermelho (Yam Suf), perseguidos pelos egípcios, e disseram "Não havia túmulos no Egito?" (Shemot 14:11). Segundo Rashi (França, 1040 - 1105), Moshé não mencionou diretamente os assuntos nos quais eles transgrediram nestes lugares em consideração ao povo judeu e à sua dignidade. Porém, ao longo da Torá, vemos que diversas vezes o povo judeu foi severamente repreendido após atos inapropriados. Então por que esta repreensão de Moshé foi diferente? Além disso, assim começa a Parashá: "Estas são as palavras que Moshé dirigiu a todo Israel do outro lado do Yarden" (Devarim 1:1). O versículo enfatiza que Moshé falou a todo o povo judeu. Rashi explica que todos tinham que estar presentes, pois se Moshé tivesse repreendido apenas uma parte do povo, aqueles que não estivessem presentes poderiam alegar que, se estivessem ali, teriam sido capazes de se defender das acusações e refutá-las. Mas por que isso não parecia um pré-requisito nas broncas anteriores. Por que estas diferenças? Para explicar as dificuldades mencionadas anteriormente, é necessário primeiro abordar outra dificuldade. Como mencionamos, o Midrash interpreta os nomes dos lugares que aparecem no início da Parashá como uma alusão às transgressões do povo, entre elas algumas que ocorreram imediatamente após a saída do Egito. Isso significa que não foram cometidas pelas pessoas que estavam diante de Moshé, mas sim pela geração anterior, pessoas que já não estavam mais vivas. Então por que Moshé criticou o povo pelas transgressões da geração anterior? A resposta está logo após a transgressão do bezerro de ouro, quando D'us quis destruir todo o povo judeu. Moshé implorou muito, até que conseguiu despertar a Misericórdia Divina. D'us então ensinou a Moshé os "13 Atributos de Misericórdia Divina", para que fossem utilizados nas situações nas quais fosse necessário despertar a Misericórdia de D'us. Porém, nas palavras finais do versículo está escrito "Ele não limpa completamente (a transgressão). Ele visita a iniquidade dos pais nos filhos e nos filhos dos filhos, até a terceira e quarta gerações" (Shemot 34:7). Aparentemente D'us estava dizendo que os filhos seriam castigados por causa do erro dos seus pais. Rashi explica que estas palavras se referem a uma situação específica, na qual os filhos dão continuidade às más ações de seus pais, isto é, repetem seus maus caminhos. Isto significa que um indivíduo pode ser responsabilizado pelas transgressões de seus pais apenas se ele continuar em seus maus caminhos, mas se ele não seguir os maus caminhos dos pais, não será responsabilizado pelo comportamento negativo deles. No entanto, de acordo com o Talmud (Brachót 7a), esta lei só é verdadeira em um nível individual. Já em um nível nacional, a responsabilidade pelas transgressões das gerações anteriores é sempre carregada por todos os cidadãos da nação, mesmo aqueles que não tenham nenhuma conexão com os erros de seus ancestrais. Explica o Rav Yochanan Zweig que a razão disso é que um cidadão de uma nação faz parte da mesma "entidade" à qual seus antecessores pertenciam. Ele é como um "acionista" de uma "entidade corporativa" e, como tal, é responsável por quaisquer transgressões ou erros perpetrados por outros "acionistas", mesmo de gerações anteriores. A culpabilidade não depende, portanto, se o indivíduo estava ou não envolvido no delito. O simples fato de pertencer à nação já o coloca em uma situação de responsabilidade coletiva. Moshé estava ensinando àquela geração que era deles a responsabilidade de consertar os danos causados por seus antepassados. Eles não podiam se desconectar das ações de seus ancestrais alegando que não estavam continuando a cometer os mesmos delitos deles. Moshé estava se dirigindo a eles como "herdeiros da entidade corporativa" do povo judeu, e não apenas como filhos da geração que saiu do Egito. Por outro lado, como eles não eram os culpados diretos pelas transgressões mencionadas, não estavam sujeitos ao mesmo nível de repreensão severa que recebeu a geração anterior, e as transgressões não foram "ampliadas com lente de aumento", como ocorreu anteriormente quando a Torá se dirigiu aos culpados diretos pelas transgressões. Essa forma de repreensão exigia a presença de toda a nação. Como eles não perpetuaram os atos pelos quais Moshé os estava criticando, eles poderiam ter se equivocado e pensado que, enquanto eles próprios não se envolvessem no mesmo comportamento grave, não precisariam receber sobre si a responsabilidade por essas transgressões. Portanto, Moshé exigiu que todo o povo estivesse presente, para que pudesse explicar a todos eles que sua culpabilidade decorria de sua responsabilidade nacional e, como tal, eles eram obrigados a participar no conserto dos erros dos seus antecessores. Em outras palavras, somos responsáveis não apenas pelos nossos próprios atos, mas também pelos atos dos nossos antepassados. Como somos uma nação única, compartilhamos os méritos e também as responsabilidades. Talvez isso nos ajude a entender de forma mais profunda um importante ensinamento dos nossos sábios em relação à próxima parada do Calendário Judaico, que iniciaremos a reviver na próxima segunda-feira de noite (12/ago): Tishá be Av, o dia mais triste do ano, no qual nossos dois Templos Sagrados foram destruídos pelos nossos inimigos e todos aqueles que não foram assassinados a sangue frio foram levados cativos ao exílio. Nossos sábios ensinam: "Toda geração que não reconstruiu o Beit Hamikdash é considerada como se o tivesse destruído". Mas por que as gerações futuras são responsabilizadas pelos erros cometidos há quase dois mil anos? A explicação anterior já seria uma resposta por si só. Pela nossa responsabilidade coletiva, somos obrigados a "carregar" a transgressão dos nossos antepassados. Nos beneficiamos com os méritos deles, mas também devemos participar em seus tropeços e fazer a nossa parte para que o conserto seja alcançado. Porém, neste caso, nossa responsabilidade é ainda maior, pois mesmo em um nível individual nós também podemos ser diretamente culpados, já que continuamos a cometer as mesmas transgressões que nossos antepassados cometiam. Nossos sábios explicam que o nosso Segundo Beit Hamikdash foi destruído por causa do ódio gratuito e do Lashon Hará. São duas transgressões que causam divisão no povo, desunião e brigas, o oposto do que D'us espera de nós. Infelizmente não conseguimos erradica-las. Ao contrário, mais do que nunca há ódio, divisões e falta de entendimento dentro do povo judeu. Somente nos unimos quando somos atacados pelos nossos odiadores, mas quando as ameaças desaparecem, rapidamente voltamos ao mesmo ódio e às mesmas acusações anteriores. O Lashon Hará é algo tão enraizado no mundo que é difícil tirar isso de dentro de nós. Programas de televisão e revistas são dedicados apenas às fofocas. As redes sociais são invadidas por calúnias e difamações. Se deixarmos a vida seguir normalmente, nada mudará. Precisamos nos esforçar para mudar, principalmente entendendo a importância de evitar o Lashon Hará. A principal motivação é que todo aquele que controla a sua boca e evita um Lashon Hará, mesmo quando tem vontade de falar, está construindo uma das pedras do nosso Beit Hamikdash. Que possamos ser bons exemplos e influenciar de forma positiva todos os que estão à nossa volta. SHABAT SHALOM R' Efraim Birbojm |
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