Nesta semana lemos a Parashá Shoftim (literalmente "Juízes"). Moshé reforçou alguns pontos muito importantes, como estabelecer um sistema de justiça, a importância de escutarmos os sábios de cada geração, a proibição de procurarmos formas de adivinhar o futuro, e a Emuná necessária para o momento em que começassem as guerras de conquista da Terra de Israel. Moshé também ensinou leis éticas que deveriam ser aplicadas até mesmo nos momentos de guerra. A Parashá começa falando sobre a importância de uma sociedade buscar a justiça através do estabelecimento de Tribunais Rabínicos em cada cidade, compostos por juízes retos e honestos, que não aceitem suborno, não favoreçam nenhuma das partes envolvidas e sejam profundos conhecedores das leis, para que estejam aptos a fazer um julgamento justo. Além do mandamento de termos juízes em nossas cidades, a Torá também nos instrui a mantermos uma força policial, com papel principal de manter a ordem e aplicar as determinações do Tribunal Rabínico. Somente desta maneira podemos viver de forma harmônica, com cada um respeitando os direitos dos outros. Manter uma sociedade baseada em valores de justiça e honestidade é tão importante que a Torá enfatiza: "Tsedek, Tsedek tirdof" (Justiça, Justiça, persiga) (Devarim 16:20). Devemos nos esforçar para buscar a justiça no mundo, ou seja, é algo que não conseguimos com facilidade, precisa ser buscado sempre. A responsabilidade não é apenas dos juízes e policiais, e sim de toda a sociedade, que não pode aceitar injustiças, corrupção e desonestidade. A Parashá começa com as seguintes palavras: "Juízes e policiais você deve colocar em todos os portões que D'us dará a vocês" (Devarim 16:18). Porém, destas palavras surge uma grande pergunta. Está escrito "Juízes e policiais", mas há algo estranho nesta ordem. Normalmente os policiais devem primeiro prender o suspeito de ter cometido algum crime, e somente depois ele será julgado. A ordem, portanto, deveria ser "policiais e juízes", e não "juízes e policiais". Por que a Torá inverteu a ordem? Explica o Rav Yeshayahu Horowitz zt"l (República Checa, 1555 - Israel, 1630), mais conhecido como Shelá Hakadosh, que quando não queremos ouvir o que é certo, ou quando não estamos completamente conscientes sobre os nossos atos, mesmo que alguém nos chame a atenção e nos aponte o que estamos fazendo de errado, não conseguimos internalizar, pois não estamos abertos para ouvir o que é certo. E assim vive a maioria das pessoas, repetindo constantemente os mesmos erros por não perceber que estão errados. Mas como pode ser que fazemos tantas coisas erradas e não conseguimos perceber? A resposta está nas palavras do mais sábio de todos os homens, Shlomo Hamelech: "O caminho da pessoa é reto aos seus olhos" (Mishlei 21:2). Mesmo aquele que anda em caminhos tortos sempre acha que está fazendo o que é correto. Sempre temos as desculpas e justificativas na ponta da língua. Sempre temos em quem colocar a culpa pelos nossos tropeços. Este fenômeno não ocorre apenas com pessoas de pouca espiritualidade. Também ocorre às vezes com gigantes espirituais, como um dos maiores rabinos da época dos Tanaim, Elisha ben Abuia. Apesar de seu elevado nível espiritual, ele acabou fazendo escolhas erradas na vida, que o levaram a se desviar dos caminhos da Torá e ser conhecido como "Acher" (outro). Seu maior aluno, Rabi Meir, tentava constantemente incentivá-lo a voltar aos caminhos da Torá, mas seu esforço era em vão. Por que Elisha ben Abuia não se arrependia? Com tanto conhecimento, por que ele não voltava aos caminhos corretos? Explicam os nossos sábios que Elisha sempre tinha respostas na ponta da língua. Por exemplo, ele dizia que quando era bebê, muitos dos grandes rabinos da geração foram convidados para o seu Brit Milá. Seu pai percebeu em certo momento que havia um fogo na sala. Logo ele descobriu que a fonte daquele fogo eram dois rabinos que estavam estudando Torá. Quando o pai de Elisha viu o nível de santidade daqueles homens, ele decidiu dedicar seu filho totalmente ao estudo da Torá. Porém, como o pai fez aquele ato com intenções impróprias, em busca de honra, sua dedicação para a Torá não foi duradoura. Outra resposta que Elisha sempre utilizava era que, quando ele ainda estava no ventre de sua mãe, certa vez ela passou por uma casa de idolatria, sentiu o cheiro de um incenso de idolatria e teve desejo de ter proveito daquele cheiro. Ele dizia que aquele cheiro o havia afetado como o veneno de uma cobra. Finalmente, Elisha dizia que não se arrependia pois certa vez havia escutado uma Voz Celestial que dizia: "Se arrependam, filhos desviados! Todos podem se arrepender de seus pecados, exceto Acher". Em outras palavras, por que Elisha ben Abuia não se arrependia? Pois ele não enxergava seus erros como sendo consequência de seus maus atos. Ele sempre tinha em quem colocar a culpa por seus tropeços. A culpa era de seu pai, de sua mãe, até mesmo de D'us, mas nunca dele. Se a falha não era dele, então por que mudar? Explica o Shelá HaKadosh que quando a Torá fala sobre colocar juízes e policiais sobre seus portões, não se refere apenas aos portões das cidades, lugares onde costumavam se sentar os juízes para fazer os julgamentos. A Torá também se refere aos portões que temos no nosso corpo: os olhos, os ouvidos, as narinas e a boca. Devemos tomar cuidado com o que vemos, com o que escutamos, com o que cheiramos e com o que falamos. O juiz, neste caso, é o conhecimento das leis da Torá. Quem não conhece as leis da Torá nunca conseguirá fazer o que é correto e evitar as transgressões. Não por maldade, mas por desconhecimento. Somente conhecendo bem as leis da Torá conseguimos nos policiar e colocar freios que nos impeçam de transgredir. É por isso a Torá escreveu juízes primeiro e só depois policiais. Não adianta colocar "policiais" em nossas vidas, nos obrigando a fazer o que é certo, enquanto não internalizarmos este conceito. Devemos primeiro ter o juízo próprio, analisando nossos atos, e assim os "policiais" nos ajudarão a manter tudo em ordem. Há dois tipos de "policiais", externos e internos. Certamente é importante, de vez em quando, recebermos broncas e advertências que nos despertam de nossa sonolência, pois a natureza do ser humano é se acomodar com o tempo. Porém, melhor do que broncas externas é quando conseguimos fazer uma autoavaliação de forma frequente, procurando e consertando nossos erros. Devemos procurar os erros em nós mesmos, não nos outros. Somente desta maneira, com muita reflexão e honestidade, poderemos aprimorar nossas qualidades e consertar os nossos erros. "Tolo é aquele que, mesmo ao ver seus navios naufragando diversas vezes, ao invés de reforçar seus navios, continua culpando o mar". Que sejamos inscritos e selados no Livro da Vida SHABAT SHALOM R' Efraim Birbojm |
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