Nesta semana lemos a Parashat Metzorá, que continua descrevendo a doença espiritual chamada Tzaráat, cuja manifestação física era o aparecimento de manchas. A Tzaráat começava atingindo as paredes de casa, em especial por causa do egoísmo. Se a pessoa falhava em aprender a lição transmitida pela Tzaráat em sua casa, seu egoísmo evoluía para um nível de arrogância. Então suas roupas, que representam a honra da pessoa, também eram atingidas pela Tzaráat. Se mesmo assim a pessoa não prestasse atenção às advertências de D'us e continuasse caindo espiritualmente, ela chegaria ao nível de total desprezo por qualquer outro ser humano. Isto é a causa principal de uma terrível atitude: falar Lashon Hará, isto é, usar a fala para denegrir e desprezar outras pessoas. Como castigo, o próprio corpo do transgressor era atingido com Tzaráat. Enquanto a Tzaráat da pele e das roupas já atingia o povo judeu mesmo quando eles ainda estavam no deserto, a Tzaráat que atingia as paredes das casas só começou a se manifestar quando o povo judeu entrou na Terra de Israel. O Midrash (parte da Torá Oral) traz uma explicação de por que isto ocorria. Os Emorim, antigos habitantes da Terra de Israel, haviam escondido seus objetos de valor nas paredes de suas casas, para evitar que caíssem nas mãos dos judeus quando eles chegaram para conquistar a terra. Parte do conserto espiritual da Tzaráat que atingia as paredes era retirar e substituir as pedras dos locais onde as manchas apareciam. Quando as pedras eram removidas, os tesouros escondidos pelos Emorim eram descobertos pelo dono da casa. Porém, este ensinamento é extremamente confuso. Se a Tzaráat aparecia nas casas por causa do egoísmo, por que D'us recompensava com tesouros esta atitude tão negativa? Quando uma casa era declarada impura pelo Cohen por estar com Tzaráat, tudo o que estivesse dentro dela também se impurificava. Por isso, antes do Cohen inspecionar as manchas da casa para determinar se era Tzaráat ou não, todos os móveis e utensílios deveriam ser removidos para que não se impurificassem. De acordo com o Midrash, esta era uma medida corretiva para o egoísmo. Pessoas egoístas fingem ter menos do que realmente têm para evitar ter que emprestar seus bens aos outros ou para se esquivar de dar Tzedaká. Ser obrigado a colocar todos os bens do lado de fora da casa, em um local público onde todos podiam ver, causava vergonha no transgressor e ajudava a expiar e corrigir seu traço de egoísmo. A Mishná (Negaim 12:5) traz outro motivo para a remoção dos bens de dentro da casa. Isto era uma mensagem muito forte de D'us ao transgressor. Quando um objeto se impurificava, ele podia ser purificado através da imersão em uma Mikve. Uma das exceções eram utensílios feitos de barro, relativamente baratos, que não podiam ser purificados. Portanto, os únicos objetos que realmente seriam perdidos caso permanecessem dentro de casa seriam os mais simples e baratos utensílios de barro. Apesar disso, D'us se preocupou mesmo com as perdas pequenas e permitiu a remoção de todos os utensílios de dentro da casa antes dela ser declarada impura. D'us assim demonstrava ao transgressor o quanto Ele valoriza os bens de cada judeu. Porém, se a intenção era curar o egoísmo, não seria mais adequado uma lição sobre a falta de importância das posses materiais? Por que foi transmitida a mensagem de dar valor mesmo para objetos de pouco valor? Outro detalhe interessante é que, em relação às leis de pureza e impureza espiritual, os utensílios de barro têm uma característica única: eles se impurificam apenas através da exposição de sua parte interna à fonte de impureza, mas não através do contato com as paredes externas do utensílio. Por que esta diferença? Pois o valor de um utensílio pode ser medido de duas formas: em termos do valor intrínseco do material com o qual ele é feito e em termos do seu valor funcional. Utensílios de barro têm pouco valor intrínseco, sendo somente a utilidade que dá a eles o seu valor. Para que algo contraia impureza espiritual, ele deve ter algum valor. Por isso, um utensílio de barro somente se torna impuro através do contato da fonte de impureza com a sua parte funcional, a parte interna, e não através do contato com o material da parede externa. A palavra egoísmo, em hebraico, é "Tzarut Ain", literalmente "olho estreito". Isto significa que o egoísmo é resultado de não apreciarmos o verdadeiro valor das nossas posses materiais e olharmos para elas através de uma perspectiva estreita. O Talmud (Chulin 91a) ensina que os Tzadikim (justos) valorizam suas posses materiais mais do que seus próprios corpos. A fonte deste ensinamento é o ato de Yaacov Avinu, que arriscou sua vida ao voltar sozinho, no meio da noite, para recuperar alguns utensílios de barro de pouco valor monetário. Mas o que significa que um Tzadik valoriza mais seus bens do que seu próprio corpo? Um Tzadik vê suas posses materiais como se fossem utensílios de barro, isto é, sem dar a eles nenhum valor intrínseco, ao contrário, eles dão importância apenas à sua função. De acordo com este ponto de vista, as posses materiais se transformam em ferramentas no serviço a D'us. Elas podem ser usadas, por exemplo, para fazer bondade e ajudar os outros. Tanto o nosso corpo quanto as nossas posses materiais são meios para servir a D'us. A única diferença é que nosso corpo é adquirido como um "presente de nascimento", enquanto a aquisição das nossas posses materiais exige esforços. É por isso que o Talmud afirma que os Tzadikim valorizam suas posses até mais do que valorizam seu corpo, pois a aquisição de suas posses exigiu mais esforço. A perspectiva do Tzadik em relação às suas posses materiais contrasta com a perspectiva "estreita" do egoísta, que vê somente os benefícios pessoais que suas posses podem trazer para ele. Quando a pessoa cuja casa havia sido contaminada com Tzaráat ficava ciente da preocupação de D'us com as posses de cada judeu, sua visão egoísta era colocada em questão e o processo de correção começava. A vergonha de ser exposto ao exame minucioso dos vizinhos era outro aspecto do mesmo processo de conserto. A remoção dos utensílios para o domínio público também era uma dica de que o propósito daqueles utensílios não era servir apenas a si mesmo, mas também ajudar a todos os que necessitavam deles. Os objetos de valor escondidos pelos Emorim, antigos moradores da Terra de Israel, estavam manchados pelo intenso egoísmo. Os Emorim os esconderam para privar os judeus de terem benefício deles. Nas mãos de pessoas com tendência egoístas, estas riquezas seriam terrivelmente prejudiciais. Portanto, D'us utilizou a Tzaráat como veículo para prover as riquezas de uma maneira projetada para corrigir o mal do egoísmo presente nelas. A pessoa que contraía Tzaráat era forçada a reformular suas atitudes em relação aos seus bens materiais antes de receber esta nova recompensa. Isto ajuda a explicar uma aparente contradição em relação a uma das maiores tragédias da história do povo judeu: a morte de 24 mil alunos do Rabi Akiva. De acordo com o Talmud (Yevamot 62b), eles morreram por não terem tratado com o devido respeito uns aos outros. Porém, há um Midrash que ensina que eles morreram por apresentarem um traço de caráter muito negativo, o "Tzarut Ain" (egoísmo), em relação ao seu conhecimento de Torá, isto é, eles não dividiam seus conhecimentos uns com os outros. Afinal, qual foi o motivo da morte deles, o egoísmo ou a falta de respeito? A Torá é uma das nossas posses mais preciosas, mas ela não pode se transformar em um meio para atingir engrandecimento pessoal. Quando alguém aprecia de verdade seu companheiro e o honra, deseja dividir com ele suas ferramentas para o Serviço Divino. Neste sentido, dividir os conhecimentos de Torá é uma expressão suprema de honra pelo companheiro. Portanto, as duas descrições de qual foi a falha dos alunos do Rabi Akiva são, na realidade, uma só. Ao se comportarem de maneira egoísta e não compartilharem seus conhecimentos de Torá, os alunos estavam demonstrando que não honravam seus companheiros no nível em que deveriam. A Parashat nos ensina a importância do equilíbrio na utilização do mundo material. D'us nos presenteou com o nosso corpo e com as nossas posses para que possamos também utilizar em prol dos outros. Alguém que se conecta tanto às suas posses a ponto de se tornar egoísta perdeu o propósito de sua existência neste mundo. A dica é o equilíbrio, isto é, saber utilizar o que nós temos para o nosso benefício, mas sem nunca se esquecer dos outros. SHABAT SHALOM R' Efraim Birbojm |
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