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ENCARANDO O PROBLEMA DE FRENTE – PARASHÁ DEVARIM E TISHÁ BE AV 5770 (16 de julho de 2009)
No Oeste americano, às vezes caem tempestades muito pesadas. Elas começam de repente com chuvas congelantes e a temperatura despenca abaixo de zero. Então, terríveis ventos frios começam a trazer enormes pedras de gelo. A maioria dos bois que estão no campo aberto vira de costas para as rajadas de vento e gelo. Com a força do vento, eles não conseguem resistir e começam a ser empurrados, até que inevitavelmente são jogados contra a cerca de arame farpado e não conseguem mais sair de lá. Em grandes tempestades, muitos bois acabam morrendo por causa dos ferimentos.
Mas uma raça de bois sempre sobrevive. É conhecida como "Hereford". O que eles fazem durante as tempestades? Eles não se viram de costas para as rajadas. Instintivamente eles enfrentam o vento forte. Vários bois se juntam, ombro a ombro e, com as cabeças abaixadas, ficam de frente para a tempestade. Assim, juntos, conseguem suportar por horas. Segundo os criadores de gado, nas tempestades em que a maioria dos bois morre, os Herefords são quase sempre encontrados vivos e saudáveis.
Aprendemos duas lições dos bois Hereford: que a união pode nos ajudar nos momentos mais difíceis e que a única forma de vencer as dificuldades é encará-las de frente quando elas surgem em nossas vidas"
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Com a Parashá desta semana, Devarim, começamos o último livro da Torá, também chamado Devarim. Este último livro é composto principalmente pelo discurso de despedida de Moshé Rabeinu antes de sua morte. O que faríamos nos nossos últimos momentos de vida? Tentaríamos aproveitar ao máximo o tempo, passeando e ficando junto com nossas famílias e amigos. Mas Moshé não estava preocupado com seu próprio bem estar. Quando soube que sua vida chegava ao fim, sua única preocupação era com o povo judeu. Por isto ele utilizou seus últimos momentos para falar com o povo e recordar muitos acontecimentos dos 40 anos no deserto, aproveitando para chamar a atenção do povo por alguns dos graves erros cometidos.
Assim começa a Parashá: "Estas são as palavras que falou Moshé a todo o povo de Israel ao lado do rio Jordão, no deserto, na planície frente ao Sul, entre Paran e entre Tofel, e Lavan e Hatzarot e Dizahav" (Devarim 1:1). Rashi, comentarista da Torá, explica que nestas palavras iniciais já estão contidas algumas broncas de Moshé. Os lugares mencionados são indicações das transgressões que eles haviam cometido. Por exemplo, "Planície" é referência à idolatria de Baal Peor, cometida nas planícies de Moav, e "Dizahav" é uma referência ao bezerro de ouro, pois a palavra ouro, em hebraico, é "Zahav". Mas por que Moshé não havia dado esta bronca antes? Por que deixou justamente para os últimos momentos antes de morrer?
Há outra dúvida sobre a bronca de Moshé no povo judeu. Aparentemente aprendemos que as broncas devem ser leves, feitas de forma indireta, apenas com indicações do erro cometido. Porém, a Haftará (pequeno trecho do livro dos "Profetas e Escrituras" lido no Shabat, após a leitura da Torá) desta semana nos traz a bronca que o profeta Yeshaiahu deu no povo judeu na época do Primeiro Templo. A bronca é muito dura, como está escrito: "O boi conhece seu dono e o jumento a tigela de seu possuidor, mas Israel não tem conhecimento, Meu povo não reflete" (Yeshaia 1:3). Por que esta diferença tão grande entre as duas broncas?
Explica o Rav Leib Chassman que existem dois grupos distintos de pessoas no mundo. O primeiro grupo são aqueles que constantemente refletem na vida e prestam atenção para onde seus atos estão o levando. O segundo grupo são aqueles que não param na vida para refletir para onde estão indo, como se estivessem dormindo de pé.
A geração do deserto estava no grupo daqueles que refletiam sobre seus atos. Por causa disso o nível espiritual deles era tão alto que Moshé não precisou nem mesmo mencionar as transgressões cometidas, apenas a citação dos lugares foi suficiente. Por que Moshé somente deu a bronca perto de sua morte? Pois esta é mais uma qualidade das pessoas que refletem na vida. Moshé sabia que eles reconheceriam os erros cometidos de uma maneira tão intensa que teriam vergonha de olhar novamente para ele depois da bronca. Por isso deixou para os últimos momentos, para que eles não passassem esta vergonha de ter que olhá-lo no dia seguinte.
Já a geração do profeta Yeshaiahu havia caído muito em seu nível espiritual. O profeta entendeu que simples indicações das transgressões não seriam suficientes para despertar o povo, por isso utilizou palavras duras. Por que comparou o povo com o cavalo e o jumento? Estes animais reconhecem seu dono por natureza e, portanto, isto ocorre constantemente. Mas para o ser humano não é tão simples assim, seu nível espiritual de conexão com o Criador do mundo depende de suas escolhas e do grau de reflexão na vida. Se o ser humano reflete e com isso endireita seus caminhos na vida, ele se eleva acima de todas as criaturas. Mas se ele não reflete e deixa a vida acontecer sem nenhum planejamento ou investimento, ele fica abaixo até mesmo dos animais. Quando D'us criou o mundo, antes criou toda a natureza e os animais e somente no último dia criou o ser humano. Por que? Pois se o ser humano se eleva espiritualmente e cumpre seu papel no mundo, D'us diz para ele: "Eu criei todo o universo para você, e queria que estivesse tudo pronto quando você chegasse". Porém, se a pessoa se desvia do seu caminho e se fasta do Criador, Ele diz: "Até mesmo o mosquito foi criado antes de você".
As broncas de Moshé e de Yeshaiahu podem ser associadas a um pai que vê seu filho dormindo e sabe que se ele não despertar atrasará para a escola. Se o sono do filho é leve, um simples chamado pode despertá-lo, mas se o sono é pesado, o tom do chamado vai aumentando cada vez mais. Se for necessário, o pai chega a chacoalhar o filho. Assim também é a forma como D'us se comporta conosco. Quando Ele nos vê "dormindo" espiritualmente, Ele sofre com o que estamos perdendo e tenta nos acordar. Quanto mais pesado o sono, mais forte precisa ser o "despertador".
Na próxima 2ª feira de noite (19/07), começa Tishá Be Av, um dos dias mais tristes do ano judaico. É um dia em que grandes tragédias se abateram sobre o nosso povo. Neste dia nossos dois Templos Sagrados foram destruídos, fomos expulsos da Espanha e Portugal e muitas outras desgraças ocorreram. Por que? Pois quando não refletimos, não percebemos que nossos caminhos estão errados e não os consertamos. A geração de Yeshaiahu foi advertida, mas não se arrependeu dos seus atos e o Primeiro Templo foi destruído. A geração do Segundo Templo também não enxergou seus erros e até hoje continuamos sem nosso Templo. Qual foi o erro dos nossos antepassados que até hoje não conseguimos ainda consertar? O ódio gratuito dentro do povo judeu. D'us nos chacoalhou várias vezes na história, mas mesmo assim insistimos em permanecer dormindo.
O que acontece quando os próprios judeus se agridem e não se respeitam? D'us nos manda um sinal. E tivemos um grande sinal há pouco tempo. Segundo o judaísmo, nada acontece por acaso. O incidente dos navios de "ajuda humanitária" que se dirigiam para Gaza nos ensinaram que o anti-semitismo não morreu na Segunda Guerra Mundial. Ele continua presente, nas manchetes dos principais jornais do mundo, nos comentários nas escolas e faculdades, na proporção que o caso tomou. Em qualquer país do mundo navios que invadissem águas territoriais seriam imediatamente afundados. Mas Israel, antes de qualquer chance de esclarecimentos, foi apedrejado pelo mundo inteiro. Somente assim os judeus do mundo inteiro se juntaram e se mobilizaram contra a opinião pública. Somente assim voltamos a nos sentir parte de um povo só.
Por que precisamos do anti-semitismo para nos unir? Por que não podemos despertar do nosso sono espiritual antes de receber "pedradas" celestiais? Até quando vamos culpar os palestinos e os terroristas quando os culpados somos nós mesmos? Enquanto colocarmos a culpa nos outros e não encararmos o problema de frente, nunca conseguiremos vencê-lo.
Ensinam nossos sábios que Tishá Be Av é um dia triste, mas que futuramente se tornará o dia da redenção final. Que cada um possa trabalhar para apagar seu ódio gratuito para que neste Tishá Be Av possamos estar todos juntos em Jerusalém. Não chorando de tristeza pela destruição do nosso Templo, mas chorando de alegria pela sua reconstrução.
SHABAT SHALOM
Rav Efraim Birbojm
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