TISHÁ BE AV

 

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TISHÁ BE AV
POR QUE CHORAR?

POR QUE CHORAR?


“Atualmente, viajar para Israel e visitar o Kotel (Muro das Lamentações) é algo natural para milhares de judeus do mundo inteiro. Mas nem sempre foi assim. Por muitos anos Jerusalém esteve nas mãos dos árabes e os judeus eram proibidos de visitar o Kotel, a única parte remanescente do nosso Beit Hamikdash (Templo Sagrado) destruído pelos romanos.

A história recente de Israel foi marcada por momentos dramáticos de luta e guerra, quando os judeus, sempre em desvantagem, conseguiram vitórias milagrosas contra seus vizinhos árabes. Foi o que ocorreu na Guerra dos 6 dias, em 1967, quando Israel lutou sozinho contra Egito, Jordânia, Síria, Iraque, Kuwait, Arábia Saudita, Argélia e Sudão, e venceu. De todas as lembranças memoráveis, talvez o momento mais emocionante, eternizado em fotos e filmes, foi quando um grupo de paraquedistas israelenses conseguiu capturar a Cidade Velha de Jerusalém e chegar até o Kotel.

Entre os soldados que foram os primeiros a chegar ao Kotel estavam muitos jovens religiosos que, tomados pela imensa emoção, choravam sem parar, com a cabeça encostada no Muro. Os soldados não-religiosos ficaram afastados, vendo aquela cena sem entender muito bem o que estava acontecendo. Um deles, de repente, começou a chorar. Seu amigo perguntou, curioso:

- Ei, por que você está chorando?

O jovem rapaz, ainda chorando, respondeu:

- Eu estou chorando por ver todas estas pessoas chorando e não saber nem porque eu deveria estar chorando.”

 

O PRIMEIRO TISHÁ BE AV


No primeiro ano após a saída do Egito, o povo judeu já se aproximava de Israel e finalmente poderia entrar na Terra Sagrada que havia sido prometida por D’us desde a época dos nossos patriarcas, Avraham, Yitzchak e Yaacov. Mas o povo, ao invés de confiar na palavra de D’us, decidiu enviar espiões para verificar se a terra era realmente boa. Dos 12 espiões enviados, 10 voltaram falando mal da terra e convenceram o povo de que era impossível conquistá-la. O povo chorou durante toda aquela noite, esquecendo todas as bondades e milagres que D’us havia feito para salvar o povo do Egito e sustentá-los no deserto, deixando D’us irritado com a falta de confiança. Ele então disse ao povo: “Vocês choraram sem motivo. Portanto, Eu fixarei esta noite como uma noite de choro para as futuras gerações”. Esta noite era Tishá Be Av.

O erro dos espiões custou caro ao povo judeu. Toda aquela geração recebeu o duro decreto de não entrar na Terra de Israel. O povo judeu teve que permanecer 40 anos no deserto, até que toda aquela geração morresse e uma nova geração pudesse entrar em Israel. Posteriormente presenciamos a destruição dos nossos Templos Sagrados e da Cidade Velha de Jerusalém. Tudo como uma consequência do Lashon Hará (maledicência) dos espiões.

O poder da fala está relacionado com a criação do ser humano, como está descrito: “E Ele (D’us) soprou em suas narinas a alma da vida, e o homem se tornou uma alma viva” (Bereshit 2:7). Unkelos, o sábio que traduziu a Torá para o aramaico, traduz “alma viva” como “alma falante” ressaltando que o poder da fala é o que diferencia o ser humano de todas as outras criaturas. O ser humano é a única criatura capaz de conceber ideias e articular pensamentos através da fala, construir ou destruir com ela, e o Lashon Hará reflete a falta de controle da pessoa sobre o seu corpo. O Talmud (Sanhedrin 39a) descreve o ser humano como sendo uma fusão de duas entidades: a mente e o corpo, e o ser humano tem essa luta constantemente, todos os dias da sua vida, entre o seu instinto de dizer o que bem entende, sem pensar, e o autocontrole, que o faz se segurar na hora da raiva e, assim, impedir que seus instintos vençam o seu intelecto, evitando possíveis estragos.

 

TRAGÉDIAS DURANTE A HISTÓRIA


Tishá Be Av (dia 9 do mês judaico de Av) se tornou uma data extremamente triste para o povo judeu. Esta data foi marcada na história do povo judeu por inúmeras desgraças, entre elas: a destruição dos 2 Templos Sagrados de Jerusalém, a queda da cidade de Betar, o decreto de expulsão dos judeus na Espanha no ano de 1492, entre outros.

 

POR QUE OS TEMPLOS FORAM DESTRUÍDOS?

 

A causa da destruição do Primeiro Templo foram as três grandes transgressões que o povo cometia naquela época: assassinato, idolatria e relações ilícitas. Tudo isso levou o povo a começar a transgredir o Shabat e a abandonar o estudo da Torá.

O Segundo Templo foi reconstruído na época de Esther e do Rei Achashverosh. Porém foi destruído 420 anos depois, no ano 70 e.c., como consequência das graves transgressões de ódio gratuito e Lashon Hará (malediscência), ou seja, o desprezo de uns judeus pelos outros. A partir deste acontecimento, a Shechiná (presença divina) se afastou do mundo e, com ela, foram embora as profecias e muitos milagres que ocorriam ao povo judeu.

 

SE O TEMPLO ERA TÃO ESPECIAL, POR QUE NÃO CHORAMOS PELA SUA PERDA?

 

Uma mulher estava grávida e teve complicações no parto. O médico disse que deveriam escolher entre a vida da mãe e do bebê. A mãe quis dar a vida ao filho. O bebê nasceu, e o pai lhe ensinava, esperando o dia em que ele poderia dizer o Kadish por sua mãe. Quando o menino fez Bar Mitzva, falou o Kadish sem nenhum sentimento. O pai ficou furioso: Sua mãe morreu para te dar vida, e é assim que você agradece? O filho pergunta: mas como vou ter sentimento? Não conheci ela!

Nimshal: D'us queria ter destruído o povo judeu, mas preferiu descarregar Sua fúria no Beit Hamikdash. E quando chega Tishá Be Av, a data em que o Beit Hamikdash foi destruído para nós dar vida, o que fazemos? Não derramamos uma lagrima! Mas por que deveríamos, nem conhecemos?

É costume chorar em Tishá Be Av por todos esses acontecimentos e, em especial, por não termos mais o nosso Beit Hamikdash. Mas como sentir falta de algo que nunca presenciamos?

Nossa vida, em muitos momentos, é boa e confortável. Nós não sentimos que está faltando nada. Nós acreditamos na ilusão do mundo físico e imaginamos que a vida é boa como ela é. Vivemos anestesiados e alienados da vida real que poderíamos viver.

Mas a verdade é que, apesar de todas as coisas boas que temos na vida, lá no fundo cada um de nós sente que algo está faltando. Algumas vezes isto se manifesta na confusão que temos sobre o propósito da vida, outras vezes na decepção de sentirmos que não atingimos nosso potencial, ou até mesmo naquela estranha sensação de que a vida poderia ser mais do que ela é. Quem nunca escutou sobre a “crise da meia-idade” ou sobre os altos índices de depressão que atinge velhos e jovens, homens e mulheres? Pessoas ricas, bonitas e sociáveis se afundam em terríveis depressões. O que falta para elas?

Há cerca de 2000 anos nós tínhamos o nosso Templo em Jerusalém, que constantemente nos lembrava quem somos, quais são as nossas prioridades e para onde estamos indo. Era nossa âncora em um mundo escuro e tempestuoso. O Templo não era apenas uma construção bonita, era a manifestação física da nossa conexão com D’us, como diz o versículo “Construam para Mim um Templo, e Eu morarei dentro de vocês” (Shemot  25:8). Não está escrito “dentro dele”, e sim “dentro de vocês”, mostrando que a construção do Templo significou, para cada judeu, uma real conexão com D’us. Nos dias do Beit-Hamikdash, a presença de D’us e a existência da espiritualidade eram evidentes e o ateísmo era uma grande piada. As pessoas podiam ir para Jerusalém e literalmente sentir Sua presença. Havia claridade e autoestima, pois as pessoas conseguiam entender que haviam sido cridas à imagem e semelhança de D’us. As pessoas viviam com propósito, com o entendimento de que tinham um objetivo a ser alcançado.

Quando o Beit-Hamikdash foi destruído, nós perdemos tudo o que tínhamos. A base de toda a alienação e baixa autoestima que vemos atualmente no mundo está enraizado na destruição do nosso Beit-Hamikdash. Tishá Be Av vem para contrastar a maneira como vivemos e a maneira como poderíamos viver. O Kotel é chamado “Muro das Lamentações” pois, mesmo passados mais de 2000 anos, nós ainda choramos e lamentamos tudo o que perdemos com a destruição do nosso Beit-Hamikdash.

Se nós não sentirmos a falta do Beit-Hamikdash em nossas vidas, então não há mais esperança de reconstruí-lo. Portanto, se neste Tishá be Av não conseguirmos chorar pela falta do nosso Beit-Hamikdash, que possamos ao menos chorar pelo fato de não sentirmos vontade de chorar.

“Desde o dia em que o Beit-Hamikdash foi destruído, nunca mais houve um dia em que o céu esteve perfeitamente claro” (Talmud Brachót 59)

 

POR QUE UM CASTIGO TÃO DURO? D’US NÃO É BOM?

 

D’us é a Fonte de toda a bondade e de toda a misericórdia. Quando vemos consequências tão graves durante toda a nossa história, obviamente o primeiro questionamento é: por que D’us foi tão duro conosco? Por que tanta tristeza e tragédias?

De acordo com o Rav Eliahu Dessler zt”l, D’us se comporta conosco da mesma maneira que um professor se comporta com seus alunos. Quando um aluno faz bagunça, atrapalha a aula e não deixa os outros alunos aprenderem, ele é duramente castigado pelo professor. Porém, o castigo não foi causado pelo professor, foi uma consequência do mau comportamento do aluno, que estava prejudicando a si mesmo e aos outros. Portanto, os castigos que D’us nos manda não é escolha Dele, é escolha nossa, é consequência do nosso comportamento negativo.

 

O ÓDIO GRATUITO E A DESUNIÃO

 

O Talmud, no Tratado de Guitin (55b), explica que Yerushalaim foi destruída por causa de um incidente que envolveu duas pessoas, Kamtza e Bar Kamtza. Uma pessoa era amiga de Kamtza e inimiga de Bar Kamtza. Ele mandou seu servo convidar Kamtza para um banquete, mas o servo se enganou e convidou Bar Kamtza. Quando o dono da festa viu Bar Kamtza, seu inimigo, sentado na mesa, ficou furioso e pediu para que ele fosse embora. Bar Kamtza, envergonhado, chegou a oferecer pagar todo o banquete para não ser humilhado em público, mas sua oferta não foi aceita e ele foi expulso. Indignado com o grande número de sábios que estavam presentes e não fizeram nada para evitar sua humilhação pública, Bar Kamtza caluniou os judeus às autoridades romanas, dando o início a vários eventos que culminaram com a destruição do Templo.

Entendemos que o Talmud coloque a culpa da destruição do nosso Beit Hamikdash em Bar Kamtza, o homem que arquitetou um plano malvado para convencer o imperador romano que os judeus estavam se rebelando. Porém, por que o Talmud menciona também Kamtza, como se ele também tivesse culpa? O que ele fez de errado?

Explica o Maharshó que Kamtza era o pai de Bar Kamtza. A palavra “Bar”, em hebraico, significa “filho”. Kamtza sabia do ódio intenso que havia entre o dono da festa e seu filho, e mesmo assim não fez nada para esfriar este ódio tão intenso. Segundo o judaísmo, quando alguém tem a oportunidade de ajudar a trazer a paz e não o faz, é considerado como se ele mesmo tivesse o ódio. Kamtza não se esforçou para que houvesse paz. Por sua passividade, também foi considerado como responsável pela destruição do Templo, junto com todos os sábios que estiveram presentes no banquete e não se levantaram para protestar contra a humilhação pública de Bar Kamtza.

Deste ensinamento do Talmud aprendemos algo impressionante para nossas vidas. Quando escutamos o termo "ódio gratuito", imaginamos duas pessoas que se odeiam com todas as suas forças, ódio que muitas vezes pode levar até mesmo a agressões físicas. Mas a verdade é que o conceito de ódio gratuito é muito mais amplo, não se restringe somente a um ódio ativo. Passividade e falta de interesse nas necessidades do próximo também são consideradas ódio gratuito. Se alguém na festa tivesse se levantado e lutado para evitar que uma injustiça acontecesse, o Templo não teria sido destruído. A indiferença das pessoas em relação às tragédias que ocorrem com os outros foi o que causou esta apatia e, consequentemente, a destruição.

 

E O QUE NÓS TEMOS A VER COM ESTAS HISTÓRIAS TÃO ANTIGAS?

 

Porém, se o erro do povo judeu no deserto e a destruição dos dois Templos ocorreu há tanto tempo, qual é a nossa culpa? Por que devemos reviver algo que, a priori, não tem nada a ver conosco?

Explicam os nossos sábios que cada geração que não reconstruiu o Beit Hamikdash é considerada como se o tivesse destruído. Portanto, Tishá Be Av é uma época de introspecção, um momento de reflexão sobre os nossos erros. O fato de não termos o Beit Hamikdash nos nossos dias significa que continuamos cometendo o mesmo erro dos nossos antepassados. Isto significa que não nos esforçamos para sentir a dor do próximo, para ajudar aqueles que necessitam.

A cura do ódio gratuito é o amor gratuito. Não precisamos esperar as pessoas virem pedir ajuda, precisamos desenvolver a sensibilidade de sentir quando uma pessoa precisa de auxílio, mesmo sem ela precisar falar nada. O coração de uma mãe sempre sabe quando um filho precisa de ajuda, pelo enorme amor que ela sente por ele. Assim precisamos nos esforçar para sentir a dor e a necessidade das outras pessoas.

 

LEIS E COSTUMES DE 9 DE AV

 

A PARTIR DE 17 DE TAMUZ: É proibido escutar músicas, cortar o cabelo e a barba e realizar casamentos.

A PARTIR DE ROSH CHODESH AV (para os Sefaradim, a partir do Domingo que antecede 9 de Av): Devemos restringir nossa alegria e evitar situações que possam nos alegrar. Não se plantam árvores, nem se inicia a construção ou reforma de uma casa. É proibido comprar ou confeccionar sapatos e roupas novas, e também lavar roupas. Também não se consome carne e vinho. É proibido banhar-se por prazer. Podemos apenas lavar as partes do corpo separadamente e sem água quente. As restrições não se aplicam no Shabat, mas se aplicam até a metade do dia 10 de Av.

NA VÉSPERA DE 9 DE AV: a refeição que antecede o jejum tem que ser composta por um pão molhado em cinzas e um cozido (como Ivo ou lentilhas, que são comida de enlutados), sentados no chão ou em um lugar baixo, de até 24 cm de altura.

NO DIA DE 9 DE AV (que se inicia no pôr do sol):

·         Não usar calçados de couro, não banhar-se, não untar o corpo, não ter relações maritais, não comer ou beber.

 ·         É proibido estudar Torá, pois o estudo da Torá alegra a alma. A exceção são livros contendo assuntos de luto e sobre a destruição dos Templos.

 ·         Como estamos de luto, o costume é sentar-se no chão ou numa cadeira baixa (de até 24 cm) até o meio do dia. A partir deste período já se pode sentar normalmente em qualquer cadeira ou sofá.

 ·         Não se cumprimenta as pessoas, como nas leis de uma pessoa enlutada.

 ·         Não se realizam trabalhos que desviem a nossa mente do luto.

 ·         Não se vestem roupas finas.

 ·         Em Arvit (reza da noite) e Shacharit (reza manhã) lemos Kinot (Lamentações) e Meguilá Eichá.

 

“Certa vez Napoleão Bonaparte passeava com seu exército pelas ruas de Paris e, ao passar na porta de uma sinagoga, ficou espantado por ver os judeus sentados no chão, chorando. Curioso, entrou e perguntou aos judeus: Por que vocês estão chorando? E os judeus responderam:Porque o nosso Beit Hamikdash foi destruído! E Napoleão tornou a perguntar: Quando foi? Eu não escutei nada sobre isso! E os judeus responderam: há ----anos atrás.Admirado, Napoleão Bonaparte declarou: ‘Um povo que chora e guarda o luto por quase 2 mil anos sem perder a esperança, será um povo próspero e terá o mérito de ver o seu Templo reconstruído’!”

 

 


 


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