sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

SHABAT SHALOM MAIL - PARASHÁ VAIETZE 5769

BS"D

QUEM É O VALENTE? - PARASHÁ VAIETZE 5769 (05 de dezembro de 2008)

O rabino Chizkiahu Madini, que se tornou um grande estudioso de Torá, conta que quando era jovem não tinha nenhum talento especial para o estudo, enquanto muitos outros jovens do Colel (centro de estudos de Torá para pessoas casadas) onde ele estudava se destacavam pelo brilhantismo. Apesar disso ele sempre era o primeiro a chegar e estudava com dedicação. Logo começou a ter bons resultados e a chamar a atenção das outras pessoas. Um dos outros estudantes do Colel começou a ficar com muita inveja e bolou um plano para caluniá-lo e fazer com que fosse expulso. O invejoso subornou uma empregada árabe, que todos os dias vinha fazer a limpeza do local, para que ela dissesse a todos que aquele jovem estudante havia tentado agarrá-la.

Em uma certa manhã a empregada árabe entrou na sinagoga e viu que apenas o jovem estudante já havia chegado e estava imerso nos seus estudos. Quando ela viu que os outros estudantes começavam a entrar no prédio, saiu da sinagoga gritando que havia sido atacada e agarrada à força. Todos ficaram indignados com o comportamento daquele jovem pervertido e começaram a agredi-lo com ofensas e palavras duras. O rapaz conseguiu fugir antes dos outros estudantes chegarem ao nível de agredi-lo fisicamente. A história ficou conhecida em toda a cidade, causando um grande Hilul Hashem (diminuição do nome de D'us no mundo), pois todos acreditaram cegamente na empregada. O único que não acreditou foi o Rosh Colel (rabino chefe), que conhecia bem o rapaz e sabia que ele seria incapaz de fazer algo assim. Apesar dos protestos, manteve o rapaz no Colel e imediatamente despediu a empregada.

Depois de algum tempo o dinheiro do suborno terminou e a empregada árabe foi procurar o rapaz que ela havia caluniado. Ela chorou muito, pediu perdão pelo que havia feito e se comprometeu a ir desmentir em público tudo o que havia ocorrido, revelando a todos que um dos estudantes do Colel a havia subornado para que ela espalhasse a calúnia. A única coisa que ela pediu em troca de limpar o nome do rapaz foi que ele falasse com o Rosh Colel e o convencesse a readmiti-la no emprego, pois ela não tinha mais dinheiro nem mesmo para comprar comida.

O rapaz começou a sentir uma guerra se travando dentro dele. Por um lado ele estava feliz pela oportunidade de limpar seu nome e provar para todo mundo que era inocente. Mas um outro pensamento o incomodava, pois um grande Hilul Hashem já havia sido causado, e se a verdadeira história viesse à tona um novo Hilul Hashem seria causado pelo comportamento vergonhoso do outro estudante. Ele seria humilhado em público, perderia o emprego e o respeito de todos. Por isso talvez seria melhor continuar aguentado a humilhação calado, até que a raiva das pessoas passasse. A luta interna era terrível e a cada instante ele mudava de idéia. Finalmente ele virou-se para a empregada e falou:

- Sobre o que você me pediu para convencer o Rosh Colel a recontratá-la, eu concordo em tentar. Mas eu te proíbo, com todas as minhas forças, de contar a qualquer um sobre o suborno e a calúnia!

O rabino Chizkiahu Madini conta que no momento em que ele tomou aquela difícil decisão, que poderia colocar em risco todo o seu futuro como estudante de Torá, ele sentiu que todas as Fontes de sabedoria haviam sido abertas diante dele. Ao invés de qualquer dano, ele meritou uma grande ajuda dos Céus e se tornou um grande e destacado estudante de Torá.
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Na Parashá desta semana, Vaietze, Yaacov fugiu para escapar da raiva de seu irmão Essav, que queria matá-lo. Foi para a casa de seu tio Lavan, que tinha duas filhas, Rachel e Lea. Yaacov se apaixonou por Rachel, a filha mais nova, não por sua beleza física, mas por suas características espirituais. Como não tinha nenhum dinheiro para o dote, Yaacov trabalhou sete anos por Rachel.

A Torá nos conta que Lavan era uma pessoa extremamente desonesta em todos os seus atos e tentou enganar Yaacov durante todos os anos em que ele trabalhou por Rachel. Yaacov era exatamente o oposto, uma pessoa correta e honesta. Mas Yaacov não era tonto, ele sabia que seu tio faria de tudo para enganá-lo e tentou se precaver de todas as maneiras possíveis. E assim está escrito: "Yaacov amou Rachel, e então ele disse (para Lavan): 'Eu trabalharei para você sete anos por Rachel, a sua filha, a mais nova" (Bereshit 29:18). Por que Yaacov teve que falar "a sua filha, a mais nova"? Ele falou "a sua filha" pois sabia que se falasse apenas "Rachel", Lavan traria aos final dos sete anos uma outra mulher chamada Rachel. E Yaacov também falou "a mais nova" pois imaginou que Lavan poderia trocar o nome de suas filhas. E se mesmo assim Lavan tentasse enganá-los, Yaacov combinou com Rachel um código que ela deveria dizer no momento do casamento, quando estivesse com a cabeça coberta pelo véu e não fosse possível enxergar seu rosto. Mas a Torá nos ensina que, apesar de todos os esforços de Yaacov, Lavan teve sucesso em trocar as filhas. Como isso foi possível?

Nos ensina o Midrash (parte da Torá Oral) que o povo judeu, durante a época do Primeiro Beit-Hamikdash (Templo Sagrado), cometeu o terrível pecado da idolatria. D'us decidiu destruir o Beit-Hamikdash e exilar o povo judeu para sempre. Imediatamente as almas dos patriarcas e das matriarcas começaram a implorar por misericórdia. Mas a transgressão era tão grave aos olhos de D'us que nem os méritos de Avraham, nem de Itzchak nem de Yaacov eram suficientes. Somente quando Rachel chorou e implorou por perdão D'us escutou e falou: "Suas lágrimas não foram em vão, Rachel. Pelos seus méritos Eu trarei no futuro o povo judeu de volta do exílio". Qual foi o grande mérito de Rachel?

No dia do casamento de Rachel com Yaacov, ela estava muito feliz, afinal havia encontrado um grande Tzadik com que poderia construir uma casa com muita espiritualidade. Porém, no decorrer do dia começou a perceber que algo estranho estava acontecendo. Ao invés de seu pai Lavan prepará-la para o casamento, quem estava sendo preparada era sua irmã Lea. Ela entendeu que as suspeitas de Yaacov estavam corretas, pois Lavan ia mesmo tentar enganá-los. Quando Lea estava saindo para o casamento, Rachel lembrou-se do código que havia combinado com Yaacov. Ficou pensando o que aconteceria quando Lea fosse desmascarada sob a Chupá, diante de centenas de convidados. Ficou imaginando a vergonha e a humilhação que ela passaria na frente de todos. Juntando todas as suas forças, Rachel correu até Lea e contou-lhe o código. Yaacov havia se precavido contra todas as formas de enganação, mas nunca havia lhe passado pela cabeça que Rachel poderia chegar naquele nível espiritual quase sobre-humano de abrir mão de sua felicidade para não envergonhar sua irmã em público. E somente assim foi possível que realmente Lavan enganasse Yaacov.

Quando a alma de Rachel apresentou-se diante de D'us para pedir misericórdia pelo povo judeu, ela falou: "Criador do Universo, eu esperei sete anos para me casar com o meu amado Yaacov. Meu pai tramou para me trocar pela minha irmã Lea, e quando eu percebi que Lea seria envergonhada se a trama fosse descoberta, então eu tive compaixão pela minha irmã e ensinei para ela o código. Eu superei meus próprios sentimentos e não fui egoísta. Eu permiti a presença de uma concorrente na minha própria casa. Portanto, se eu fui capaz de fazer isto, Você, que é infinitamente misericordioso, também pode perdoar o Seu povo que, por uma falha, colocou um concorrente na Sua casa". D'us concordou com Rachel e prometeu, pelos méritos dela, trazer de volta o povo judeu.

Vivemos em um mundo onde o valente é aquele que não leva desaforo para casa e que defende a sua honra através do uso da violência. Valente é aquele com língua afiada, rápido em responder qualquer ofensa com palavras duras. Mas esta definitivamente não é a visão da Torá, como nos ensina o Pirkei Avót (Ética dos Patriarcas): "Quem é o valente? Aquele que vence a sua má-inclinação". Muitos na história conseguiram conquistar cidades mas não conseguiram conquistar seus próprios instintos.

A salvação do povo judeu virá pelos méritos de Rachel. Dela aprendemos o enorme valor de uma pessoa fechar a boca para não humilhar outra pessoa em público. Os nossos sábios ensinam que o mundo é sustentado por aquele que fecha a boca no momento da discussão. Passar por cima da raiva não é sinal de covardia, é sinal de grandeza, pois se você bate em um animal, ele imediatamente revida. O que nos eleva acima de todo o mundo material é a capacidade de não revidar, a força de manter o controle, mesmo nas condições mais adversas.

Shabat Shalom

Rav Efraim Birbojm

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