quinta-feira, 8 de abril de 2010

SHABAT SHALOM MAIL - PARASHÁ SHEMINI 5770

BS"D

A CULPA É DOS OUTROS – PARASHÁ SHEMINI 5770 (09 de abril de 2010)

"Um poderoso rei vivia sendo cobrado por seus súditos, que eram muito exigentes e queriam uma cidade perfeita. O rei então quis testar seus súditos para saber se eles eram tão exigentes consigo mesmos como eram com os outros. Colocou uma grande pedra no meio da rua principal e ficou escondido, observando se as pessoas se preocupariam em desobstruir a rua ou passariam como se não tivessem visto a pedra.

Durante todo o dia as pessoas que passavam pela rua viram a grande pedra ali, obstruindo o caminho, mas não fizeram absolutamente nada. Elas sentiam que não era obrigação delas fazer nenhum esforço, pois entendiam que a culpa era do rei. Elas preferiam apenas desviar da pedra e continuar seus caminhos. Muitas pessoas olhavam a pedra e, além de não fazer absolutamente nada, ainda praguejavam o rei, pois achavam que ele não estava se esforçando para manter as ruas limpas. Outros pensavam que havia muitos moradores naquele reinado e, portanto, outra pessoa certamente se esforçaria para retirar a pedra. O resultado foi que, quase no final do dia, a pedra ainda estava ali, no meio do caminho, sem que nenhum morador tivesse se preocupado em retirá-la.

Chegou então um homem que carregava um enorme pacote de vegetais nas costas. Ele viu aquela enorme pedra no meio do caminho, que obrigava todos a se desviarem do caminho. Ele tinha todos os motivos para deixar para que os outros fizessem o serviço, afinal, ele carregava algo realmente pesado nas costas. Ele tinha todas as razões para falar mal do rei e reclamar da sua má administração. Mas ele não fez nada disso, pois ele sentia que se a pedra estava ali, no meio da rua pública, então também era sua obrigação tirá-la dali. Ele calmamente colocou seu pesado fardo no chão e empurrou a pedra com toda a sua força. Após muito esforço ele finalmente conseguiu mover a pedra.

Quando estava colocando de volta seu fardo nas costas, ele viu que havia algo no meio da rua, exatamente no lugar onde anteriormente estava a pedra. Parecia uma sacola, e estava cheia. Abriu a sacola e viu que ela continha centenas de moedas de ouro e um envelope. Era um bilhete escrito e selado pelo próprio rei. O bilhete dizia:

- Todo este ouro pertence ao cidadão que encontrá-lo. Pois é o cidadão que entendeu que, para que nosso reinado seja um lugar realmente melhor, cada um deve receber sobre si a responsabilidade de melhorá-lo, ao invés de colocar a culpa dos problemas nos outros"

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Nesta semana lemos a Parashá Shemini, que descreve um momento único do povo judeu: a inauguração do Mishkan (Templo Móvel). Em cada um dos sete dias iniciais de inauguração Moshé montou o Mishkan inteiro, fez sozinho todo o serviço sagrado e no final desmontou o Mishkan. No oitavo dia (Shemini, em hebraico) Aharon e seus filhos foram consagrados como Cohanim (sacerdotes). Daquele dia em diante apenas os Cohanim estavam aptos a fazer os serviços do Templo. Moshé então comandou Aharon, o Cohen Gadol (Sumo-sacerdote) a fazer todos os serviços, como está escrito: "E Moshé disse: 'É isso que D'us ordenou a vocês. Façam e então a presença de D'us aparecerá para vocês" (Vayikrá 9:6).

A Parashá então descreve todo o serviço realizado por Aharon, entre eles o oferecimento de alguns Korbanót (sacrifícios). E assim a Torá descreve o final do serviço no dia da inauguração: "E então ele (Aharon) desceu após ter realizado as oferendas de pecado, as oferendas de elevação e as oferendas de paz. Moshé e Aharon vieram para a Tenda da Assinação, e eles saíram e eles abençoaram as pessoas. E a presença de D'us apareceu para todo o povo" (Vayikrá 9:22,23). Este versículo é difícil de ser entendido por dois motivos. Primeiro, se os Cohanim já haviam sido consagrados para os serviços do Templo, por que Moshé precisou entrar junto com Aharon? E segundo, por que quando Aharon terminou o serviço do Mishkan a presença de D'us não apareceu imediatamente, conforme Moshé havia dito, tendo aparecido somente depois que Moshé e Aharon entraram juntos no Mishkan, algum tempo após a finalização do serviço?

Uma das características mais comuns do ser humano é se esquivar da culpa. Talvez para proteger nosso ego, constantemente jogamos a culpa dos nossos erros nos outros. Mesmo quando chegam sobre nós sofrimentos, o primeiro impulso é questionar a bondade de D'us, ao invés de questionar os nossos próprios atos e procurar algum motivo para o sofrimento ter recaído sobre nós. E isso é tão frequente que chegamos a pensar que este é o normal e o desejável ao ser humano.

Na Parashá desta semana aprendemos que um dos maiores sinais de grandeza de um ser humano é saber assumir a culpa pelos seus erros e aceitar as consequências. Isso demonstra maturidade e, principalmente, humildade. Foi exatamente o que aconteceu com Aharon HaCohen. Explica Rashi, comentarista da Torá, que quando Aharon terminou o serviço do Mishkan, a presença de D'us realmente deveria ter aparecido imediatamente, mas nada aconteceu. O que qualquer um de nós faria? O natural seria colocar a culpa nos outros, até mesmo em D'us, que não havia cumprido Sua "promessa". Mas não foi o que Aharon fez. Imediatamente ele procurou Moshé e disse: "Moshé, eu sei que D'us está bravo comigo por causa da minha participação na construção do bezerro de ouro. É por minha culpa que a presença de D'us não apareceu no Mishkan". Moshé então entrou no Mishkan junto com Aharon, rezou pela misericórdia de D'us e somente depois disso a presença de D'us apareceu.

Mas Aharon, um grande Tzadik (Justo), realmente havia participado da construção do bezerro de ouro? Explicam nossos sábios que Hur, cunhado de Moshé, tentou impedir os judeus quando eles começaram a construir o bezerro e foi imediatamente assassinado. Aharon entendeu que se ele tentasse impedir, também seria assassinado, aumentando ainda mais a culpa do povo e o conseqüente castigo. Então ele teve a idéia de fingir que estava interessado na construção e tomou sobre si o comando do "projeto". Ele queria ganhar tempo até a volta de Moshé e por isso pediu para o povo trazer suas jóias de ouro, na esperança de que as pessoas se negariam a trazer as suas próprias jóias e o processo demoraria muito tempo. Infelizmente o povo estava tão obstinado na construção do bezerro de ouro que todos trouxeram rapidamente o seu ouro e o bezerro acabou realmente sendo construído, o que foi considerado, em certo nível, responsabilidade de Aharon, apesar de suas boas intenções.

Porém, já que a participação de Aharon na construção do bezerro de ouro foi algo tão secundário, ao contrário da maioria do povo, que realmente doou seu ouro e construiu o bezerro com alegria e entusiasmo, por que ele recebeu sobre si a culpa da presença de D'us não ter vindo para o Mishkan? Por que ele não atribuiu o insucesso ao resto do povo, ficando com sua consciência limpa e tranquila?

Isso nos ensina quem são os grandes do nosso povo, que devem ser os nossos modelos de conduta em todos os tempos. Eles nos ensinam o que D'us realmente quer de nós e nos mostram que temos um grande potencial adormecido dentro de nós que, com muito esforço e dedicação, pode ser alcançado. Aharon nos ensinou que quando chega sobre nós algum tipo de sofrimento ou dificuldade, ao invés de procurar o que o outro está fazendo de errado, tempos que antes de tudo procurar o que nós mesmos estamos fazendo de errado. E este conceito não deve ser aplicado somente nos pequenos acontecimentos. Mesmo em grandes tragédias cada um de nós deve se sentir culpado pelas coisas que estão acontecendo no mundo. Explica o livro Messilat Yesharim (Caminho dos Justos) que quando o homem se eleva espiritualmente, o mundo inteiro se eleva junto com ele, mas quando o homem se corrompe, o mundo também se corrompe. D'us criou uma natureza perfeita e harmônica, mas quando o ser humano não se comporta dentro dos limites que D'us impôs, então a natureza também avança sobre seus limites e as catástrofes acontecem.

Estamos em um momento óbvio de "descontentamento" de D'us. Nos últimos meses o número de catástrofes "naturais" que ocorreram no mundo foi impressionante. Terremotos devastaram o Haiti e castigaram duramente o Chile. Chuvas em intensidades nunca antes registradas alagaram São Paulo e Rio de Janeiro, causando centenas de vítimas e muita destruição. Tempestades de neve e ondas de calor castigaram diferentes lugares do globo. Tsunamis, que até poucos anos atrás eram palavras encontradas somente nos dicionários, se tornaram constantes. Será tudo coincidência? Especialistas sempre trazem explicações naturais para estes fenômenos. Por que tanto interesse em procurar respostas naturais? Pois é mais fácil procurar culpados na natureza ou limpar a consciência culpando o aquecimento global do que procurar a culpa em cada um de nós. As pessoas grandes não fazem isso, elas não procuram culpados fora. Elas param para refletir quando escutam sobre alguma tragédia e procuram as causas nos seus próprios atos.

Esta é a decisão que temos que tomar em nossas vidas: viver uma vida de ilusão, onde só os outros são culpados de todos os problemas e nós somos sempre os injustiçados, ou viver na realidade de que nós também cometemos erros e muitos dos sofrimentos que chegam até nós são consequências diretas dos nossos próprios erros.

SHABAT SHALOM

Rav Efraim Birbojm

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